Cânones de Dort

Os Cânones de Dort – Sua história

Jacob Harmenszoon (holandês), que ficou conhecido

como Jacobus Arminius (Latim), (1560-1609), foi um teólogo

e também ministro da Igreja Reformada Holandesa, que se

opôs a doutrina da predestinação, conforme Calvino ensinava,

e desenvolveu sua própria doutrina, que ficou conhecida

depois como arminianismo. Arminius, interpretava a doutrina

bíblica da eleição, como sendo condicional, isto é, a oferta

divina da salvação, poderia ser ou não, afetada pela vontade

livre do homem. Após a morte de Arminius, vitimado pela

tuberculose, os adeptos, simpatizantes e defensores de seus

ensinos, provocaram grandes distúrbios dentro dos arraiais

reformados. Os arminianos, representavam uma espécie de

reavivamento das antigas doutrinas semipelagianas, que

haviam tanto tempo, perturbado a boa ordem da Igreja cristã.

Esses seguidores desses falsos ensinos, compuseram e

assinaram em 1610, um documento teológico, chamado

Remonstrance, no qual resumiram em cinco pontos a sua

rejeição do calvinismo clássico. Por calvinismo, entenda-se a

doutrina apostólica e histórica, sobre a salvação pela graça

mediante a fé, tudo como um dom de Deus. Foi então, que a

Igreja Reformada Holandesa, para resolver a controvérsia

arminiana, convocou um concílio, que se reuniu em

Dordrecht, entre 13 de Novembro de 1618 e 09 de Maio de

1619, em 154 sessões, onde as ideias arminianas, foram

reprovadas e consideradas antibíblicas. Após seis meses de

trabalho exaustivo, os teólogos estrangeiros, partiram e os

teólogos holandeses permaneceram para 22 sessões adicionais

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devotadas, em sua maioria, à preparação de uma nova liturgia

e ordem eclesiásticas. Nesse concílio, conhecido como o

Sínodo de Dort, o arminianismo foi desacreditado,

condenado pelo sínodo, e os arminianos foram considerados

hereges. Dos teólogos que compuseram esse sínodo, disse um

antigo escritor: “Os membros deste sínodo formavam uma

constelação dos melhores e mais eruditos teólogos, que já se

congregaram num concílio, desde a dispersão dos apóstolos;

salvo se excetuarmos a convocação imperial de Nicéia, no

quarto século” [Biographia Evangélica II, p. 456]. No Sínodo

de Dort, foi escrito um documento, que ficou conhecido

como Os Cânones de Dort, que abordam cinco tópicos

doutrinários, em 59 artigos: (1) A predestinação divina; (2) A

morte de Cristo e a redenção do homem; (3-4) A corrupção

do homem e sua conversão a Deus; (5) A perseverança dos

santos. As principais ênfases do documento, são as seguintes:

Deus elege e reprova, não com base na previsão de fé ou

incredulidade, mas por sua vontade soberana; a morte de

Cristo, foi suficiente para todos, mas é eficaz somente para os

eleitos; mediante a queda, a humanidade ficou totalmente

corrompida; a graça de Deus atua eficazmente, para converter

os descrentes, embora não o faça por coerção; Deus preserva

os crentes, de modo que não podem decair totalmente da

graça. Essas declarações, foram resumidas em algumas

expressões conhecidas, como “Os Cinco Pontos do

Calvinismo”: Depravação total, Eleição incondicional,

Expiação limitada, Graça irresistível e Perseverança dos

santos, cujas iniciais em inglês formam a palavra “TULIP” –

Total depravity – Unconditional election – Limited atonement

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– Irresistible grace – Perseverance of the saints. Se, os

arminianos tivessem prevalecido, e suas doutrinas

introduzidas na Igreja de Cristo, uma catástrofe seria

inevitável, cujo resultado final seria destruição da doutrina

cristã da salvação pela graça. A partir dos Cânones – o caráter

incondicional e gracioso da eleição; a expiação de Cristo

limitada em seu desígnio e amplitude; a depravação total do

homem; a graça irresistível; e a perseverança dos santos –

foram todos, em resposta aos cinco artigos da Remonstrance,

com a intenção de estabelecer, clara e inequivocamente, o

absoluto e gracioso caráter da salvação, que “não depende do que

quer, nem do que corre, mas de Deus, que se compadece” - Romanos

9.16.

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A eleição e a reprovação divinas

Capítulo 1

Artigo 01 – Toda a humanidade é condenável diante

de Deus

Como todos os homens pecaram em Adão, estão

debaixo da maldição e merecem a morte eterna. Deus não

teria feito injustiça a ninguém se tivesse sido sua vontade

deixar toda a raça humana no pecado e debaixo da maldição, e

condená-la por causa do seu pecado, de acordo com estas

palavras do apóstolo: “para que se cale toda a boca, e todo o mundo

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seja culpável perante Deus… pois todos pecaram e carecem da glória de

Deus” (Rom. 3.19-23) e “o salário do pecado é a morte” (Rom. 6.23).

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Comentário: Todos os homens pecaram, portanto,

todos são culpados e dignos de morte. Assim, o que quer que

Deus faça com as criaturas caídas, é absolutamente justo. Os

anjos caíram e Ele os condenou, justamente, às trevas eternas.

Se agisse da mesma forma em relação ao homem, estaria

apenas manifestando sua justiça. Mas, quando quis prover um

meio de redenção, para uma parte deles, estava revelando sua

misericórdia. É direito inalienável de Deus, distribuir seus

dons, como e a quem desejar. É direito seu, fazer o que quiser

com todas as suas criaturas, e em toda a sua criação - “Ou não

me é lícito fazer o que quiser do que é meu?” - Mateus 20.15. Se

Deus, não se revelasse aos homens, todos se perderiam; se

resolvesse nunca mais falar com o homem, nunca mais o

homem retornaria à sua presença. Mas, Ele buscou o homem,

para trazê-lo de volta. Entretanto, revela-se à quem escolheu

fazê-lo, e aqueles à quem Ele se revela são salvos; aqueles

porém, à quem Ele não se revela, permanecem perdidos em

seus pecados. Se desejasse salvar a todos, Ele o faria, mas

onde revelaria sua justiça? Aqueles à quem não mostra a sua

misericórdia e graça perdem-se eternamente. Alguém já disse,

que a humanidade perdida, é como um grande navio de

passageiros, à deriva com o casco furado. Todos os

passageiros irão fatalmente morrer; é apenas uma questão de

tempo. Assim, toda a humanidade irá naufragar e perecer em

seus pecados. Mas Deus, em sua infinita misericórdia salva

muitos dentre eles, porém não todos. Que injustiça ele faria se

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não salvasse a ninguém? Nenhuma. Então, que injustiça ele

faz com aqueles que não salva? Nenhuma. Por outro lado, que

justiça faz ele para com os que salva? Também nenhuma. E

que justiça para com os que são abandonados em seus

pecados? Para com esses, Deus faz justiça. Logo, para com

aqueles que salva, ele revela sua graça e seu amor, para com os

que se perdem, revela sua justiça e sua ira. De modo que só

podemos dizer, que Deus é justo e também misericordioso -

“Aos justos nasce luz nas trevas; ele é piedoso, misericordioso e justo” -

Salmo 112.4.

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Artigo 02 – O envio do Filho de Deus

Mas nisto se manifestou o amor de Deus: em que ele

enviou seu Filho Unigênito ao mundo, “para que todo aquele que

nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo. 3.16).

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Comentário: Deus criou os céus é a terra e tudo quanto

há neles; na terra, onde criou o homem, decretou a queda; no

contexto de um mundo caído, pôde expressar seus

maravilhosos atributos, revelando o eu maravilhoso Ser. Na

criação Ele expressou seu poder, sua glória, sabedoria e

majestade; na redenção Ele revelou seu amor, graça,

misericórdia; na punição dos ímpios, revelou sua santidade,

justiça e ira santa. Tudo o que Deus fez ou decretou para a

sua criação, sempre tem um bom e santo propósito; nada é

por acaso, mas tudo com propósito. Dizer que tudo é mero

casuísmo, isto é, produto do acaso, denota superfluidade e

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desprezo para com a criação e o Criador. Não é isso, pois

Deus tem, em tudo o que acontece na vida das suas criaturas,

um propósito certo e definido. Naturalmente, que seus

propósitos são tremendamente elevados e não os podemos

atingir. Como criaturas que somos, jamais podemos

perscrutar os mistérios eternos. Ainda como criaturas temos

uma agravante: somos criaturas caídas. Nossas mentes

embotadas pelo pecado, não têm a mínima chance de sondar

tais maravilhas de Deus. Por isso, é sábio, quando depararmos

com os seus mistérios, que nos prostremos humilhados e o

adoremos na beleza da Sua santidade. O Filho eterno de

Deus, veio a este mundo para salvar aqueles, a quem Deus em

conselho eterno, decretou salvar. Ele escolheu dentre os

homens de todos os tempos, de todas as raças, de todas as

nações, um povo para Si. Foi por eles, que Jesus Cristo se

ofereceu a si próprio como sacrifício - “Eu rogo por eles; não rogo

pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus” - João 17.9.

Estes, e apenas estes, creem de fato em Cristo para a salvação,

porque muitos outros há, que até professam nele crer, mas

sua fé não é autêntica, não vem acompanhada de

arrependimento, de regeneração, de santificação e por isso

não os salva.

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Artigo 03 – A pregação do evangelho

Assim, para que os homens sejam conduzidos à fé, Deus

misericordiosamente envia arautos dessa mais bemaventurada mensagem a quem ele quer e quando quer. Pelo

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ministério desses arautos, os homens são chamados ao

arrependimento e à fé no Cristo crucificado. Pois, “como, porém,

invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de quem

nada ouviram? E como ouvirão, se não há quem pregue? E como

pregarão, se não forem enviados” (Rom. 10.14-15).

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Comentário: Deus, em sua infinita sabedoria, decretou

salvar os eleitos através da pregação. E, se o meio pelo qual

chama seus escolhidos, é a pregação do evangelho, então, o

trabalho da Igreja é pregar esse evangelho. Essa, é a sua

missão inestimável e insubstituível neste mundo. Entretanto,

se a pregação do evangelho, não trouxer tantos quantos

gostaríamos, não alcançar a todos que objetivávamos, não

despertar o espírito e trazer ao convívio da Igreja todos

quantos almejávamos, devemos confiar e esperar em Deus;

porque, se a pregação não fizer esse trabalho, é porque não há

o que fazer ali ou, o que deveria ser feito, já o foi. Contudo,

jamais a Igreja deve se desesperar, e lançar mão dos recursos e

estratégias do mundo para atrair pessoas, como se o resultado,

fosse sua responsabilidade. O evangelho genuíno, não precisa

da ajuda de artifícios para atrair as ovelhas. Elas ouvem a voz

do Pastor, e vêm a ele. Jesus veio para as suas ovelhas

perdidas, e elas, quando ouvem a sua voz, correm para ele -

“As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as, e elas me

seguem; E dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as

arrebatará da minha mão. Meu Pai, que mas deu, é maior do que

todos; e ninguém pode arrebatá-las da mão de meu Pai” - João 10.27-

29. Os que não vêm a Cristo ao ouvir sua Palavra, é porque

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não são suas ovelhas - “Mas vós não credes porque não sois das

minhas ovelhas, como já vo-lo tenho dito” - João 10.26. Esses, que

querem unir-se à Igreja por causa do ambiente agradável, da

boa música, dos bons relacionamentos, das atividades, dos

entretenimentos, mas não por causa da Palavra de Cristo, não

são das suas ovelhas. Quem Deus deseja salvar, ele o atrairá

pela sua Palavra - “Nós somos de Deus; aquele que conhece a Deus

ouve-nos; aquele que não é de Deus não nos ouve” - 1ª João 4.6. É

isto, que o apóstolo, fala em Romanos 10. Àqueles a quem

Deus deseja salvar, ele mesmo enviará mensageiros com sua

Palavra. Estes pregarão, e aqueles darão ouvidos e serão

trazidos à família da fé. Igreja é o resultado da pregação da

Palavra de Deus. Multidão que resulta de palestras

motivacionais, de um evangelho positivista e triunfalista,

composto de meias-verdades, sem a cruz de Cristo, recheadas

de entusiasmo carnal, essa multidão não é Igreja. É um povo

enganado e iludido por falsas promessas de uma vida fácil, de

prosperidade, saúde, triunfo, sucesso e ainda pela garantia do

céu após a morte. Mas a verdadeira Igreja, é aquela que resulta

da pregação do genuíno evangelho de Cristo. Ali, estão

aqueles que foram atraídos, não para receberem uma cura

física e temporal, uma promessa de benção material, mas

foram atraídos para o Bom Pastor, ouvindo a sua voz - “Eu sou

o bom Pastor, e conheço as minhas ovelhas, e das minhas sou

conhecido... Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco;

também me convém agregar estas, e elas ouvirão a minha voz, e haverá

um rebanho e um Pastor” - João 10.14, 16. A responsabilidade dos

mensageiros, é serem fiéis a mensagem e não pelos resultados.

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A Igreja deve buscar ser fiel a qualquer custo, e não buscar

resultados a qualquer custo.

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Artigo 04 – Um duplo resultado

A ira de Deus permanece sobre os que não creem nesse

evangelho. Mas aqueles que o recebem e abraçam a Jesus, o

Salvador, com uma fé verdadeira e viva, são libertos por ele da

ira de Deus e da destruição, e a eles é dada a vida eterna.

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Comentário: Assim está escrito: “Aquele que crê no Filho

tem a vida eterna; mas aquele que não crê no Filho não verá a vida,

mas a ira de Deus sobre ele permanece” - João 3.36; e também:

“Quem crer e for batizado será salvo; mas quem não crer será condenado”

- Marcos 16.16. Embora seja Deus quem escolha aqueles que

irá salvar eternamente, quando o Evangelho é proclamado, há

um grande e alto chamado de Deus, a todos quantos têm

ouvidos para ouvir - “Dizendo ele estas coisas, clamava: Quem tem

ouvidos para ouvir, ouça” - Lucas 8.8. Este, é um grande mistério,

pois muitos ouvem, mas não atentam para o que ouvem; já os

que foram destinados para a salvação, não apenas ouvem, mas

escutam, dão ouvidos, seu espírito é despertado, recebem a

Palavra com grande alegria, creem, vêm e recebem a Cristo

como seu Salvador - “E os gentios, ouvindo isto, alegraram-se, e

glorificavam a palavra do Senhor; e creram todos quantos estavam

ordenados para a vida eterna” - Atos 13.48. O apóstolo Paulo

disse, que sua mensagem para alguns tinha cheiro de vida, já

para outros, cheiro de morte - “E graças a Deus, que sempre nos

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faz triunfar em Cristo, e por meio de nós manifesta em todo o lugar a

fragrância do seu conhecimento. Porque para Deus somos o bom

perfume de Cristo, nos que se salvam e nos que se perdem. Para estes

certamente cheiro de morte para morte; mas para aqueles cheiro de vida

para vida. E para estas coisas quem é idôneo?” - 2ª Coríntios 2.14-16.

Uma vez que a expiação de Cristo é suficiente para salvar o

mundo inteiro, e não sabemos quem são os eleitos de Deus,

precisamos anunciar a todos os homens, em todos os lugares

as boas novas. E foi isso que o Senhor nos ordenou: “Portanto

ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e

do Filho, e do Espírito Santo…”; “E disse-lhes: Ide por todo o mundo,

pregai o evangelho a toda criatura. Quem crer e for batizado será salvo;

mas quem não crer será condenado” - Mateus 28.19; Marcos 16.15-16.

Assim, a pregação do Evangelho, equaciona um duplo

resultado: aceitação por parte de uns, e rejeição por parte de

outros. A autêntica pregação leva os homens a reagirem e se

posicionarem, uns o acolhem e outros não. Aqueles que

pensam que podem ficar neutros, na verdade já se

posicionaram. O Senhor Jesus definiu apenas dois grupos: os

que são por ele e os que são contra ele - “Quem não é comigo é

contra mim; e quem comigo não ajunta, espalha” - Mateus 12.30.

Dele disse o profeta Simeão: “Eis que este é posto para queda e

elevação de muitos em Israel…” - Lucas 2.34.

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Artigo 05 – A causa da incredulidade e a fonte da fé

A causa ou a culpa dessa incredulidade, assim como a de

todos os outros pecados, não está de modo nenhum em

Deus, e sim no homem. No entanto, a fé em Jesus Cristo e a

salvação através dele é o dom gratuito de Deus, como está

escrito: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de

vós; é dom de Deus” (Ef. 2.8). Semelhantemente, “porque vos foi

concedida a graça [… ] de credes nele” (Fp. 1.29).

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Comentário: Quando a Bíblia fala sobre crer em Deus,

quer dizer mais do que acreditar que ele existe e que é o

Criador de todas as coisas. Bem poucos são, se é que existem,

os que não creem na existência de Deus. Há aqueles que

negam com seus lábios, mas em seu íntimo ainda tentam se

convencer de que ele não existe. Entretanto a fé que é dom de

Deus aos eleitos é uma confiança absoluta nele. De modo que

ter fé em Deus é confiar nele, obedecê-lo e segui-lo ou andar

com ele. Alguém pode dizer acreditar que Deus existe, mas

não confia a sua vida a ele, não o ama, nem o serve. Muitos

são os que afirmam crer em Deus e em Jesus Cristo, contudo,

não têm uma fé bíblica, segundo as profecias, conforme os

fatos e declarações de Deus nas Escrituras - “Porque

primeiramente vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu por

nossos pecados, segundo as escrituras, e que foi sepultado, e que

ressuscitou ao terceiro dia, segundo as escrituras - 1ª Coríntios 15.3-4. É

preciso crer, mas crer segundo o ensino bíblico, segundo as

escrituras. Muitos creem num falso Cristo, criado segundo

suas mentes caídas. Para muitos, Cristo foi um grande profeta,

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um grande mestre. Para outros Jesus é uma espécie de papai

noel, ou um curandeiro. Há os que veem nele um

revolucionário, que promoveu uma contracultura em seus

dias. Há também, aqueles que até aceitam que Jesus foi um

deus, significando um ser evoluído. Todos esses, porém, estão

equivocados a respeito de quem foi Jesus de Nazaré, e por

isso têm uma crença errada e um tipo de fé que é inferior a

dos demônios. Os demônios sabiam e confessavam que Jesus

de Nazaré era o Filho de Deus, mas não o amavam e nem o

obedeciam - “Dizendo: Ah! que temos contigo, Jesus Nazareno? Vieste

destruir-nos? Bem sei quem és: o Santo de Deus” - Marcos 1.24. Os

demônios têm um grande conhecimento de Deus e Jesus

Cristo, têm mais experiências dos que qualquer homem jamais

teve, mas mesmo assim estão condenados. Da mesma forma

muitos crentes professos que têm grande conhecimento,

experiências, muitas boas obras, mas estão condenados

porque sua fé, não os leva a amar a Cristo e identificar-se com

ele, nem a viver para sua glória e para o seu agrado. A fé

salvífica, é um dom maravilhoso de Deus aos seus eleitos.

Essa fé vem acompanhada de: 1) uma profunda consciência

de pecado; 2) um profundo arrependimento pelos pecados; 3)

um reconhecimento de Cristo Jesus como o único Mediador e

Salvador. 1.1) A consciência de sua pecaminosidade o humilha

e o leva a reconhecer sua total dependência de Deus. Dá-lhe

entendimento de que não há qualquer justiça pessoal que o

possa salvar, nenhuma obra que o possa recomendar diante

de Deus. 2.1) O arrependimento que acompanha a fé

salvífica, também é um dom de Deus, e quando o eleito o

recebe, corre para Cristo para ser perdoado, reconciliado e

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aceito na Família de Deus. 3.1) Juntamente com a fé o eleito

recebe uma revelação de Cristo, isto é, da Pessoa e obra de

Cristo. Ele compreende a absoluta suficiência da redenção de

Cristo, e por isso deposita toda sua confiança só em Cristo.

Um eleito de Deus não está dividido entre crer em Cristo e

também sua justiça própria; crer em Cristo e em mais algum

outro intercessor. Não, a fé salvífica o leva a crer unicamente

em Cristo. Essa é a marca da fé, que é dom de Deus, e que é

dada apenas aos seus eleitos. Essa fé os leva andar e viver no

temor de Deus.

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Artigo 06 – O decreto eterno de Deus

Procede do decreto eterno de Deus conceder, no tempo

devido, o dom da fé a alguns e a outros não. Pois ele conhece

todas as suas obras desde a eternidade e “faz todas as coisas

conforme o conselho da sua vontade” (Ef. 1.11). De acordo com esse

decreto, ele graciosamente quebranta o coração dos eleitos,

por mais duro que seja, e os inclina a crer; entretanto, segundo

o seu juízo, ele deixa os que não são eleitos em sua própria

malignidade e dureza. E aqui, especialmente, nos é revelada a

profunda, misericordiosa e, ao mesmo tempo, justa distinção

entre homens igualmente merecedores de condenação, que é

o decreto da eleição e da reprovação, revelado na Palavra de

Deus. Embora os homens perversos, impuros e instáveis o

distorçam para a sua própria destruição, esse mesmo decreto

proporciona consolo inexprimível às almas santas e tementes

a Deus.

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Comentário: Enquanto uns ouvem a Palavra de Deus e

se quebrantam, outros a ouvem se endurecem. Uns são

erguidos do monturo enquanto outros se chafurdam ainda

mais nele. Alguém já afirmou com muita propriedade que o

mesmo sol que derrete a cera, endurece a argila. Contudo, é

Um e o Mesmo quem faz o sol, a cera, e também a argila. A

incredulidade é um pecado como os outros e pode ser

perdoado pelo Senhor. Do lado humano e humanamente

falando, o homem é culpado por não crer. Mas do lado do

eterno Conselho de Deus, o homem não pode crer se Deus

não lhe conceder a fé - “Mas vós não credes porque não sois das

minhas ovelhas, como já vo-lo tenho dito” - João 10.26. O Senhor

não disse que aqueles judeus não eram ovelhas porque não

criam, ou porque não queriam crer; ele disse exatamente o

contrário: que eles não criam porque não eram ovelhas. Isto é

aqueles que não creram foi porque não receberam a fé e não

faziam parte do rebanho eleito do Senhor. E isto, em última

instância não dependia deles. Toda escolha implica uma

rejeição; sempre que algo é escolhido, também é separado;

seja como for a escolha, uns serão preferidos em detrimento

de outros que serão preteridos. Jesus disse que o Pai lhe havia

dado um presente dentre a humanidade: “Manifestei o teu nome

aos homens que do mundo me deste; eram teus, e tu mos deste, e

guardaram a tua palavra... Eu rogo por eles; não rogo pelo mundo,

mas por aqueles que me deste, porque são teus” - João 17.6, 9. O Pai

separou dentre toda a humanidade um grupo de homens e os

deu ao seu Filho. Como esses homens haviam caído no

pecado de Adão, Jesus deveria morrer por eles para os

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redimir. E foi isso que ele fez ao vir a este mundo: comprouos dentre os homens - “E cantavam um novo cântico, dizendo:

Digno és de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque foste morto, e

com o teu sangue compraste para Deus homens de toda a tribo, e

língua, e povo, e nação” - Apocalipse 5.9. O pecador pode tomar

uma livre decisão contra a vontade expressa de Deus, e

responderá por isso, mas nunca tomará uma decisão fora dos

decretos imutáveis de Deus.

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Artigo 07 – Definição da eleição

A eleição é o propósito imutável de Deus pelo qual ele,

antes da fundação do mundo, dentre toda a raça humana,

caída pela própria culpa do estado original de integridade no

pecado e na perdição, e segundo o soberano beneplácito da

sua vontade e por pura graça, escolheu, em Cristo, para a

salvação, um número definido de pessoas específicas, em nada

melhores nem mais dignas que as outras, porém envolvidas na

mesma miséria das demais.

Ele também, desde a eternidade, constituiu a Cristo

como o Mediador e Cabeça de todos os eleitos e o

fundamento da salvação. Assim, decretou dar a Cristo os que

haveriam de ser salvos, e chamá-los e trazê-los eficazmente à

sua comunhão pela sua Palavra e Espírito.

Ele decretou conceder-lhe a fé verdadeira em Cristo,

justificá-los, santificá-los e, por fim, – depois de tê-los

preservado poderosamente na comunhão do seu Filho –

glorificá-los, para demostração da sua misericórdia e o louvor

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da riqueza da sua graça gloriosa. Como está escrito: Deus nos

escolheu em Cristo “antes da fundação do mundo, para sermos

santos e irrepreensíveis perante ele; e em amor nos predestinou para ele,

para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito

de sua vontade, para louvor da glória de sua graça, que ele nos

concedeu gratuitamente no Amado” (Ef. 1.4-6). E em outro lugar: “E

aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses

também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou” (Rom.

8.30).

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Comentário: Os eleitos foram escolhidos na eternidade,

quando o tempo não existia; eles são chamados, justificados,

regenerados, santificados, adotados no tempo; e serão

glorificados na eternidade, quando o tempo não mais existirá.

Podemos imaginar conforme o ensino bíblico, como a vida de

cada salvo foi assunto no Alto Conselho da Santíssima

Trindade e sua salvação foi ali decidida. Entendemos que

Deus pensou, planejou, decretou todas as coisas na eternidade

e as traz à existência no tempo - “Nele, digo, em quem também

fomos feitos herança, havendo sido predestinados, conforme o propósito

daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade” -

Efésios 1.11. Também o salmista cantou: “Mas o nosso Deus está

nos céus; fez tudo o que lhe agradou” - Salmo 115.3. Os nossos

documentos, fazem-nos rememorar, que ninguém deve

orgulhar-se nem supor serem melhores que os que se perdem,

porque os eleitos não são, de forma alguma, melhores do que

os demais homens, que foram deixados em seus pecados; não

são mais dignos, mas o que os diferencia é um dom que

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Os Cânones de Dort

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receberam de Deus. A essas alturas é oportuno lembrar as

palavras do apóstolo: “Porque, quem te faz diferente? E que tens tu

que não tenhas recebido? E, se o recebeste, por que te glorias, como se

não o houveras recebido?” - 1ª Coríntios 4.7. Deus fez isso de si

para si mesmo, pois tudo é para a sua própria glória. Ele “…

nos salvou, e chamou com uma santa vocação; não segundo as nossas

obras, mas segundo o seu próprio propósito e graça que nos foi dada em

Cristo Jesus antes dos tempos dos séculos” - 2ª Timóteo 1.9. Quão

grande é a misericórdia de Deus, demonstrada naqueles que

são salvos e quão perfeita justiça exercida para com aqueles

que se perdem.

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Artigo 08 – Um único decreto de eleição

Não há vários decretos de eleição, mas um único e

mesmo decreto para todos os que hão de ser salvos, tanto no

Antigo quanto no Novo Testamento. Porque a Escritura

declara que o beneplácito, o propósito e o conselho da

vontade de Deus é único. Segundo esse propósito, ele nos

escolheu desde a eternidade tanto para a graça quanto para a

glória, como também para a salvação e para o caminho da

salvação, o qual preparou para que andássemos nele.

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Comentário: Nem há vários decretos de eleição nem há

uma eleição em série, como se Deus escolhesse um grupo de

homens indistintos de cada época da humanidade. Não, mas

Deus fez um único decreto onde incluiu todos quantos

escolheu salvar dentre os filhos de Adão. Incluiu, porém um a

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Os Cânones de Dort

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um a quem escolhia, nome a nome, indivíduo a indivíduo.

Conforme a escolha, assim também é o chamado – um a um.

Assim como Jesus escolheu os apóstolos um a um, também

ele escolheu, na eternidade, os que seriam salvos. Deus é um

Ser pessoal e se relaciona com pessoas, com indivíduos e não

simplesmente com um povo. Ele trata, sim, com seu povo

como um todo, como uma grande família, porém, seu

relacionamento conosco é individual. Temos muitos exemplos

na Bíblia, de homens, que Deus identificou pessoalmente,

exemplo: de Abraão Ele diz: meu servo - “Abraão meu servo” -

Gênesis 26.24; de Moisés: “o meu servo Moisés” - Números 12.7; de

Calebe: “o meu servo Calebe” - Números 14.24; de Davi: “a meu

servo Davi” - 2º Samuel 7.5; de Jó: “a meu servo Jó?” - Jó 1.8. Assim

Deus falou dos profetas, dos apóstolos, dos discípulos,

chamando-os pelo nome, mostrando que seu relacionamento

é pessoal - “Mas agora, assim diz o SENHOR que te criou, ó Jacó, e

que te formou, ó Israel: Não temas, porque eu te remi; chamei-te pelo

teu nome, tu és meu” - Isaías 43.1. Isto tanto é verdade em relação

à toda a Congregação de Israel, como aos seus servos

individualmente, porque a eleição, o chamado e a redenção

são atos individuais. A Bíblia diz que somos filhos adotados

por Deus. Se ‘família’ denota coletividade: muitos filhos -, por

outro lado, ‘filho’ denota a individualidade na relação com o

Pai - “Como também nos elegeu nele antes da fundação do mundo,

para que fôssemos santos e irrepreensíveis diante dele em amor; e nos

predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo,

segundo o beneplácito de sua vontade” - Efésios 1.4-5.

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Artigo 09 – A eleição não se baseia em fé prevista

A eleição não se baseia em fé prevista, obediência da fé,

santidade, ou qualquer outra boa qualidade ou disposição que

seja a causa ou a condição necessária aos homens para serem

eleitos; todavia, os homens são eleitos para a fé, para a

obediência da fé, para a santidade, etc.

A eleição, portanto, é a fonte de todas as virtudes

salvadoras, de onde emanam a fé, a santidade e outros dons

salvíficos e, por fim, a própria vida eterna, como frutos e

efeitos da eleição. É isso o que o apóstolo ensina quando diz:

“assim como nos escolheu nele antes da fundação do mundo, (não

porque fôssemos santos, mas) para sermos santos e irrepreensíveis

perante ele” (Ef. 1.4).

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Comentário: Definir eleição, como uma previsão que

Deus fez na eternidade, sobre a vida de cada um daqueles que

haveria de escolher, e que escolheu conforme previu quem

creria quando fosse chamado, ou algo parecido com isso, é

colocar a causa última no homem. Isto é, Deus me escolheu

porque previu algo em mim que o motivou a fazê-lo.

Contudo, nada poderia estar mais longe da verdade. A eleição

não se baseou em fé, obras, justiça, obediência ou santidade

previstas. Não, ela não teve sua motivação no objeto

escolhido, mas apenas naquele que fez a escolha. A revelação

bíblica diz que os eleitos o foram para serem santos, para crer,

para a prática das boas obras. De modo que a eleição veio

primeiro, sendo ela a causa de todas as demais bênçãos de

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Deus na vida dos crentes. O fato é que o homem natural está

morto espiritualmente e totalmente arruinado; nessa condição

ele jamais desejará Deus, jamais buscará a Deus, pelo

contrário, ele continuará sempre fugindo de Deus para a

direção oposta. E a menos que Deus faça algo para detê-lo, o

homem cai em queda livre e somente parará quando chegar

ao fundo do inferno. Então acordará para a sua real condição,

quando será tarde, muito tarde. Na parábola do rico e Lázaro

de Lucas 16.19-31, o Senhor Jesus Cristo mostra essa

realidade. Supor que o homem natural pode ir a Deus quando

quiser seria o mesmo que afirmar que um morto pode sair da

sepultura sozinho, se assim o desejar. Tudo começou com a

soberana escolha de Deus na eternidade, depois vem o

chamado do Espírito Santo no tempo, ato contínuo a

regeneração comprovada com a santificação, e termina com a

glorificação novamente na eternidade - “E aos que predestinou a

estes também chamou; e aos que chamou a estes também justificou; e

aos que justificou a estes também glorificou” - Romanos 8.30.

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Artigo 10 – A eleição baseia-se no beneplácito de

Deus

A causa dessa eleição graciosa é tão somente o

beneplácito de Deus. Esse beneplácito não consiste em Deus

ter escolhido, dentre todas as condições possíveis, certas

qualidades ou ações dos homens como requisito par a

salvação; mas consiste em ele ter adotado, dentre a multidão

dos pecadores, certas pessoas para a sua própria possessão.

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Pois está escrito: “ainda não eram os gêmeos nascidos, nem tinham

praticado o bem ou o mal…” (Rom. 9.11-13) e já fora dito a ela [à

Rebeca]: “o mais velho será servo do mais moço” (Gen. 25.23). E

também: “todavia amei a Jacó, porém aborreci a Esaú” (Ml. 1.2,3). E

ainda: “e creram todos os que haviam sido destinados para a vida

eterna” (At. 13.48).

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Comentário: Tudo que o homem gostaria, ou tudo que

melhor se adequaria ao pensamento do pecador, é que

existisse alguma condição para a salvação; condição que

estivesse ao seu alcance cumpri-la, a fim de que, ele também

recebesse um pouco da glória. Mas, o fato é que os pecadores

são verdadeiros mendigos diante de Deus. Sim, somos como

pedintes andrajosos, que se tivermos que obter algo, isso

mesmo precisa ser nos dado. Assim é a salvação – um

presente, um dom de Deus. Se fosse um salário ou

recompensa, então apenas aqueles que trabalhassem por ela,

seriam salvos. Pessoas como o ladrão da cruz jamais poderia

ser contemplado com a salvação. Se a salvação fosse uma

premiação, então apenas os melhores a receberiam. Apenas

aqueles que tivessem sucesso a conquistariam. De qualquer

forma, seria uma seleção feita à base do mérito. Mas, não é

assim. Antes, do começo ao fim, a Bíblia nos ensina uma

salvação, totalmente gratuita, por misericórdia, pela

benevolência de Deus, que é amor e ama dar e doar-se. Deus,

escolheu salvar quem quis, e nessa lista incluiu alguns dos

piores exemplares da nossa raça, justamente para revelar a

grandeza de seu amor benevolente - “mas, onde abundou o

pecado, superabundou a graça” - Romanos 5.20. Deus salva aos que

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elegeu para a salvação, em Cristo; logo, os méritos são todos

de Cristo. Posso dizer que sim, fui salvo por méritos, mas os

méritos de Jesus Cristo. Eis o grande amor do Senhor Deus

revelado através de seu Filho Unigênito: “Porquanto com amor

eterno te amei, por isso com benignidade te atraí” - Jeremias 31.3.

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Artigo 11 – A eleição imutável

Como o propósito de Deus é infinitamente sábio,

imutável, onisciente e onipotente, assim também a sua eleição

não pode ser desfeita, refita, alterada, revogada nem anulada;

tampouco podem os eleitos ser rejeitados, nem o número

deles diminuído.

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Comentário: Se um só dos eleitos se perdesse, o

inimigo teria triunfado e Deus seria envergonhado. Se um

único homem inscrito no livro da vida se perdesse, o mal teria

obtido uma grande vitória e uma parte do propósito eterno

seria frustrado. Impensável! Impossível! O eterno Deus jamais

terá um único propósito frustrado - “Bem sei eu que tudo podes, e

que nenhum dos teus propósitos pode ser impedido” - Jó 42.2. Uma

vez o eleito chamado e declarado justo, essa sentença judicial,

forense de Deus jamais será revogada. Assim, todos os atos

decretativos de Deus são absolutamente soberanos e têm sua

causa no Conselho Eterno. Portanto, são inexoravelmente

trazidos a luz e infalivelmente concluídos. Quando ele

decretou a eleição para a salvação de um de seus servos,

também decretou o meio através do qual seria salvo;

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determinou em que tempo isso ocorreria, em quais condições,

em que localidade e quais as circunstâncias a envolveriam. O

Mediador é um: Jesus Cristo - “Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e

a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim” - João 14.6;

o meio também é um: a pregação do Evangelho - “Visto como

na sabedoria de Deus o mundo não conheceu a Deus pela sua

sabedoria, aprouve a Deus salvar os crentes pela loucura da pregação” -

1ª Coríntios 1.21. O tempo, a história e as circunstâncias variam

caso a caso, mas, nada de improvisos e imprevistos, tudo foi

decretado na eternidade. Nada é por acaso, tudo é por

propósito - “Nele, digo, em quem também fomos feitos herança,

havendo sido predestinados, conforme o propósito daquele que faz todas

as coisas, segundo o conselho da sua vontade” - Efésios 1.11. Um dos

atributos de Deus é a imutabilidade, isto é, ele não muda, não

precisa mudar, pois tudo nele é perfeito, pleno, completo,

eterno. Assim, tudo quanto faz também é perfeito, não precisa

de ajustes, adaptações, melhorias, contextualizações. Não. Por

isso ele não retrocede em suas decisões. Não existe tal coisa

como alguns dizem: “Conheci alguém que era um crente fiel e

que voltou para o mundo”. É que nós só vemos o exterior do

homem; Deus, porém, vê o coração. Alguém que foi

justificado, jamais perde esse status; alguém que foi

regenerado, jamais cai na perdição eterna; alguém que foi

tirado do monturo e foi colocado à mesa com os príncipes do

Rei, jamais decai dessa posição; pelo menos, não

definitivamente. Isto, porque Deus não retira os seus dons

uma vez que os deu. Sendo assim, o número dos eleitos não

pode ser alterado, nem para mais, nem para menos. Dos que

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Deus escolheu e deu ao seu Filho, nenhum só faltará naquele

dia; nenhum lugar estará vazio na eternidade, porque nenhum

dos escolhidos ficará para trás. Todos os eleitos de Deus serão

salvos. Cada um deles será chamado individualmente,

declarado justo, receberá fé, arrependimento, regeneração,

será selado com o Espírito Santo, viverá para Deus enquanto

estiver neste mundo e depois, no grande dia será glorificado

com Cristo.

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Artigo 12 – A certeza da eleição

Os eleitos recebem, no tempo oportuno, ainda que em

vários graus e diferentes modos, a certeza da sua eterna e

imutável eleição para a salvação. Eles , todavia, não a obtêm

quando curiosamente investigam as coisas ocultas e profundas

de Deus, mas quando observam, em si mesmos, com alegria

espiritual e santo deleite, os infalíveis frutos da eleição

indicados na Palavra de Deus, tais como a fé verdadeira em

Cristo, o temor filial a Deus, a piedosa tristeza pelos seus

pecados, e a fome e a sede de justiça.

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Comentário: Certeza ou convicção da eleição, é uma

grande bênção que os santos gozam de maneiras diferentes,

conforme a sabedoria de Deus. Ele sabe o que é bom e

adequado para cada um de seus filhos. Às vezes o que é bom

para um pode não ser para outro; então um desfruta de plena

certeza e convicção, enquanto que outro pode ter um défice

de segurança. Ambos, porém, estão igual e absolutamente

seguros, mesmo porque a segurança não depende de nós a

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percebermos ou não. Ela só depende d’ Aquele que segura

todas as suas ovelhas em suas mãos. Quanto mais

conhecemos a Deus e sua Palavra mais nos firmamos em suas

promessas. Assim vamos percebendo a segurança da eleição e

salvação que temos em Cristo. Por isso nossos documentos

dizem que uns a têm mais outros menos, mas isso não

significa que uns estão mais seguros e outros menos.

Absolutamente. Todos os filhos de Deus estão tão seguros

quanto ele os pode tornar, isto é, total e eternamente. Assim

como ninguém conhece a Deus através de investigação

curiosa, estudo ou pesquisa, da mesma forma também

ninguém obtém a certeza da eleição e salvação, e o

crescimento na graça dessa forma. É preciso esperar e confiar

em Deus humildemente, buscando-o numa relação constante

com a sua Palavra que é onde ele se revela a nós e também

nos mostra como podemos nos sentir seguros - conforme

observamos em nós próprios aqueles frutos do Espírito: “Mas

o fruto do Espírito é: amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade,

bondade, fé, mansidão, temperança” - Gálatas 5.22. Dessa forma

vamos ganhando mais confiança de que somos filhos de Deus

- “O mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de

Deus” - Romanos 8.16. Embora enquanto estiver nesse corpo, o

crente fiel sofra com muitas dúvidas, fraquezas e

imperfeições, sendo também assediado constantemente pelo

pecado, contudo ele mantém firme confiança em Cristo,

temor filial para com Deus, piedosa tristeza pelos pecados e

grande desejo de santificação. Essas são fortes evidências de

que é um salvo em Cristo. O santo joga contra o pecado, o

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ímpio joga contra Deus. O lado que cada um está identifica a

quem cada qual pertence e serve.

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Artigo 13 – O valor dessa certeza

A consciência e a certeza da eleição proporcionam aos

filhos de Deus maior motivo para se humilharem diariamente

diante dele, para adorarem a profundidade das suas

misericórdias, para se purificarem, e para amarem

fervorosamente àquele que os amou primeiro de modo tão

grandioso. Portanto, absolutamente, não é verdade que a

doutrina da eleição e o meditar nela os façam relaxar na

observação dos mandamentos de Deus ou produzam falsa

segurança. No justo juízo de Deus, isso normalmente ocorre

com aqueles que supõem atrevidamente ter a graça da eleição,

ou que falam dela de modo leviano e arrogante, mas se

recusam a andar nos caminhos dos eleitos.

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Comentário: Um eleito autêntico [e é preciso dizer

assim, porque há supostos eleitos] jamais se vangloria de

haver sido escolhido, pois sabe que não foi por seu mérito

pessoal, mas pelos méritos de Cristo Jesus. Não haveria nada

tão patético quanto um mendigo se orgulhar de um presente

que acabara de receber. Ele pode se alegrar, mas jamais se

orgulhar supondo que o merecia. Isso seria completo ridículo

e absurdo. Contudo, despropósito muito maior seria um

escolhido de Deus vangloriar-se dessa escolha e aplaudir

Deus. Nenhum eleito cometeria tal absurdo. Charles

Spurgeon disse com boa dose de humor, mas com muita

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sobriedade, algo parecido com isto: “Sei que Deus me

escolheu antes de eu nascer, porque depois ele não o teria

feito”. Voltando ao mendigo, ele jamais acharia que alguém

lhe daria um presente porque viu nele algum mérito pessoal, a

menos que tal mendigo fosse grandemente desequilibrado. E

é o que acontece com alguns supostos crentes. Vangloriam-se

da sua salvação, de sua eleição, de sua espiritualidade, como se

neles houvesse grandes méritos muito bem reconhecidos por

Deus. Diversamente, o eleito de Deus, sente-se humilhado

por receber tal bênção imerecidamente. E quanto mais

percebe o contraste entre a grandiosidade da dádiva e seu

demérito, tanto mais humilhado fica. Por isso mesmo tal

bênção jamais o torna relapso, ao contrário, fá-lo deleitar-se

mais na comunhão do Senhor e desejar ardentemente ser

parecido com ele. Sabe que continua habitando num corpo

que se ajusta bem a este mundo caído e ao sistema de satanás,

então precisa vigiar e orar em todo o tempo, mantendo-se sob

a disciplina da Palavra e do Espírito Santo. Como está escrito:

“E qualquer que nele tem esta esperança purifica-se a si mesmo, como

também ele é puro” - 1ª João 3.3.

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Artigo 14 – Como se deve ensinar a eleição

Segundo o mui sábio conselho de Deus, a doutrina da

eleição divina foi pregada pelos profetas, pelo próprio Cristo e

pelos apóstolos, tanto no Antigo quanto no Novo

Testamento, e então foi registrada nas Sagradas Escrituras.

Por isso, também hoje essa doutrina deve ser ensinada na

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Igreja de Deus, para a qual ela foi particularmente destinada,

em tempo e lugar apropriados, com espírito criterioso, de

modo reverente e santo, sem curiosa investigação dos

caminhos do Altíssimo, para a glória do santíssimo nome de

Deus, e para o vivo consolo do seu povo.

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Comentário: Tudo o que está na Bíblia deve ser

pregado e ensinado à Igreja do Senhor. Assim fizeram os

ministros de Deus desde os primórdios da Igreja. Tudo

quando os profetas e apóstolos falaram e escreveram, o

fizeram sob inspiração do Espírito Santo e, portanto, é

proveitoso para a edificação dos crentes - “Toda a Escritura é

divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redarguir, para

corrigir, para instruir em justiça…”; “Porque a profecia nunca foi

produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de

Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo” - 2ª Timóteo 3.16; 2ª

Pedro 1.21, por isso mesmo deve ser ministrado à Congregação

de Deus. Esse era o método do apóstolo Paulo, que também

foi inspirado pelo Espírito Santo: ensinar toda a Palavra de

Deus, todo o Conselho de Deus - “Porque nunca deixei de vos

anunciar todo o conselho de Deus” - Atos 20.27. A doutrina da

eleição é grandemente confortante e consoladora para os

santos. Aquele que é de Deus, ouve, crê, prostra-se e adora. Se

Deus falou ele crê, confia e descansa. Todavia ela deve ser

ensinada com critérios e sabedoria. Convém que quando esse

assunto for ensinado, faça-se um estudo completo,

sistemático, com pessoas que já tenham lido a Bíblia toda, ao

menos uma vez, para que o estudo seja mais proveitoso e

mais facilmente compreendido. Isto não quer dizer,

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absolutamente, que não se deva pregar para qualquer público,

sermões expositivos ou até temáticos sobre esse assunto, se

Deus assim conduzir. Lembrando sempre que diante de todos

os mistérios de Deus devemos nos aproximar com reverência

e humildade, nunca com espírito de curiosidade. Deus é bom

e revelou-se a ao seu povo, bem como revelou tudo quanto

precisamos saber para servi-lo. Como nosso Pai, ele nos

revela tudo o que importa sabermos, o necessário, o

suficiente. Os limites são óbvios – Ele é Deus Criador e nós

criaturas caídas que ele bondosamente redimiu, reconciliou, e

adotou como seus filhos. Que mais precisamos saber?

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Artigo 15 – A descrição da reprovação

As Sagradas Escrituras nos mostram e recomendam essa

graça eterna e imerecida da nossa eleição, especialmente

quando declaram que nem todos os homens são eleitos, mas

que alguns não são eleitos ou foram preteridos na eleição

eterna de Deus. Deus, pelo seu beneplácito mui soberano,

justo, irrepreensível e imutável, decretou deixá-los na miséria

comum em que eles se lançaram por sua própria culpa, e não

lhes concedeu a fé salvadora nem a graça da conversão.

Para mostrar a sua justiça, Deus os deixou sem seus

próprios caminhos e debaixo do seu justo juízo, decretando,

por fim, os condenar e punir eternamente, não apenas pela

incredulidade deles, mas também por causa de todos os seus

outros pecados. Esse é o decreto da reprovação, o qual não

faz de Deus o autor do pecado (só em pensar isso é

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blasfêmia!), mas, antes, o revela como o terrível, irrepreensível

e justo Juiz e Vingador do pecado.

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Comentário: Toda escolha implica uma rejeição. Se

Deus escolheu uns para serem redimidos através de Jesus

Cristo, obviamente também rejeitou outros, abandonando-os

em suas misérias espirituais. Se Deus salvasse a todos os

homens a Bíblia não falaria sobre escolha e eleição, pois seria

desnecessário. Contudo, de Gênesis ao Apocalipse

encontramos o assunto e lemos sobre muitas situações essa

escolha de Deus na prática. Então é muito óbvio e patente

que Deus faz escolhas. E antes de subir qualquer pensamento

em nossas mentes é preciso lembrar que ele é o Criador e que

não há ninguém acima dele. Logo ninguém há que possa

avaliar suas obras e ações senão ele próprio, e ele o fez; e

assim está escrito: “E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era

muito bom” - Gênesis 1.31. Quem mais pode avaliá-lo? Sabemos

que tudo quanto ele faz é bom, é justo, é certo. Tudo quanto

Deus faz tem propósitos sublimes, dignos, nobres, porque são

segundo o seu caráter. Se lhe apraz deixar os homens andarem

em seus próprios caminhos para depois puni-los revelando

sua imutável justiça, ele o faz - “O qual nos tempos passados deixou

andar todas as nações em seus próprios caminhos” - Atos 14.16;

“Portanto eu os entreguei aos desejos dos seus corações, e andaram nos

seus próprios conselhos” - Salmo 81.12. E a respeito dos que se

perdem, não é apenas por causa da sua incredulidade, mas por

causa de todos os seus pecados que não foram expiados. A

incredulidade é um pecado como outros e pode ser expiado.

Aliás, todos nós éramos incrédulos até o Espírito Santo nos

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despertar e nos dar a fé. Por isso que o Senhor Jesus disse aos

judeus incrédulos que eles não podiam crer porque não eram

ovelhas - “Mas vós não credes porque não sois das minhas ovelhas,

como já vo-lo tenho dito” - João 10.26. Não disse que não eram

ovelhas porque não criam, mas que não criam porque não

eram ovelhas. As ovelhas creem porque recebem fé para crer;

porque foram escolhidas desde o princípio pelo Supremo

Conselho de Deus - “Que nos salvou, e chamou com uma santa

vocação; não segundo as nossas obras, mas segundo o seu próprio

propósito e graça que nos foi dada em Cristo Jesus antes dos tempos dos

séculos” - 2ª Timóteo 1.9. Com os que condena Deus faz justiça;

com os que salva ele usa de misericórdia; logo, não faz

injustiça com ninguém.

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Artigo 16 – Como reagir à doutrina da reprovação

Alguns ainda não discernem claramente em si mesmos

uma fé viva em Cristo, nem uma firme confiança no coração,

nem boa consciência, nem um zelo pela obediência filial e

pela glorificação de Deus por meio de Cristo. Apesar disso,

eles usam os meios pelos quais Deus prometeu operar tais

coisas em nós. Eles não devem se assustar quando a doutrina

da reprovação é mencionada nem devem se incluir entre os

reprovados. Pelo contrário, devem continuar a usar esses

meios com diligência, almejar com fervor um tempo de graça

mais abundante, e esperá-lo com reverência e humildade.

Há também outros que desejam se converter a Deus

com sinceridade, agradar somente a ele e ser libertos do corpo

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de morte; contudo, não conseguem chegar até onde gostariam

no caminho da piedade e da fé. Essas pessoas não deveriam

ter tanto medo da doutrina da reprovação, pois Deus, que é

misericordioso, prometeu que não esmagará a cana quebrada

e nem apagará o pavio que fumega.

Há ainda outros que desprezam a Deus e ao Senhor

Jesus Cristo, e que se entregam completamente aos cuidados

do mundo e às concupiscências da carne. Para esses, a

doutrina da reprovação é mesmo apavorante, pois não se

voltam para Deus com seriedade.

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Comentário: Diante dessa doutrina todos devemos nos

humilhar, nos prostrar e adorar “Ao que está assentado no trono e

ao Cordeiro” - Apocalipse 5.13, reconhecendo quão indignos e

miseráveis todos somos, e quão merecedores da punição

eterna nos tornamos. O homem é uma criatura caída sentada

no banco dos réus diante do Grande Juiz, que “a um abate e a

outro exalta” - Salmo 75.7, e fá-lo segundo o Conselho Eterno da

sua vontade. Há momentos que todos nós, salvos em Cristo,

temos mais consciência da nossa fraqueza, impotência e de

quão atrasados estamos no caminho da santificação. De fato

todos os verdadeiros crentes gostariam de ser mais piedosos,

pois sempre achamos que estamos em débito. E se houver

alguns, que de tão fracos e débeis, chegarem quase a

desanimar por não verem em suas vidas os frutos que

gostariam de ver, a fé viva e a intrepidez que veem nos outros

santos, nem por isso devem sentir-se reprovados quando

ouvirem esta doutrina. É preciso, contudo, diferenciar

fraqueza de negligência, imperfeição de rebeldia, ignorância de

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Os Cânones de Dort

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indolência ou preguiça. O fato de alguém sentir-se fraco,

débil, impotente, grande pecador e imerecedor da salvação,

revela que Deus está agindo em sua vida. Pode ser mais

preocupante quando a pessoa se acha muito confortável e

segura de si e da sua eleição, em suas orações, em seu serviço

a Deus, em suas obras. É bom lembrar sempre, que tudo que

você recebe é por graça e pelos méritos de Jesus Cristo. Se a

pessoa luta com dificuldades, fraquezas, limitações para

compreender certos pontos da doutrina, insatisfeita com sua

piedade, mas é sincera e tem propósito sincero de mudar e

esforça-se para isso, não deve temer. A ameaça fica para

aqueles que têm uma falsa paz, uma falsa segurança, não têm

santificação e isto não os preocupa, pecam e ficam insensíveis.

Esses, sim, devem tremer diante desta doutrina.

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Artigo 17 – Os filhos de crentes que morrem na

infância

Devemos julgar a respeito da vontade de Deus com base

na sua Palavra, que declara que os filhos dos crentes são

santos, não por natureza, mas em virtude da aliança da graça,

na qual estão incluídos com os seus pais. Portanto, pais

tementes a Deus não devem duvidar da eleição e da salvação

de qualquer de seus filho, que Deus chama desta vida ainda na

infância.

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Comentário: A Congregação do Senhor é formada por

homens, mulheres e crianças. Isto é, todos os membros da

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Os Cânones de Dort

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família. As crianças fazem parte da assembleia dos santos - “E

enquanto Esdras orava, e fazia confissão, chorando e prostrando-se

diante da casa de Deus, ajuntou-se a ele, de Israel, uma grande

congregação, de homens, mulheres e crianças; pois o povo chorava com

grande choro” - Esdras 10.1. O Senhor disse que os filhos dos

crentes são seus e os vindicou através do profeta - “Além disto,

tomaste a teus filhos e tuas filhas, que me tinhas gerado, e os sacrificaste

a elas, para serem consumidos; acaso é pequena a tua prostituição? E

mataste a meus filhos, e os entregaste a elas para os fazerem passar pelo

fogo” - Ezequiel 16.20-21. Os filhos dos crentes participam das

promessas da Aliança juntamente com seus pais e o batismo é

o selo que lhes garante e assegura essas promessas. Por isso

mesmo, devem receber o batismo logo quando nascem, sendo

assim separados para Deus. Enquanto crescem, os pais devem

lhes falar da sua natureza pecaminosa e da provisão graciosa

de Deus; ensinar-lhes os privilégios, obrigações e

responsabilidades decorrentes do status que possuem, até eles

terem idade de responder por si mesmos a Deus. Contudo, se

por uma infelicidade, houver uma interrupção nesse

relacionamento e Deus chamar algum deles, devemos confiar

que esse foi o melhor momento para aquele que foi chamado

e que ele foi para o Senhor. Se qualquer dessas crianças for

levada por Deus, devemos crer que foi salva. Sabemos que

para ser salvo, o pecador precisa ser regenerado; os filhos da

Aliança também. O sinal externo, o batismo, não é garantia da

salvação, mas ele assegura as promessas da Aliança, por isso

devemos descansar no Senhor e confiar firmemente nessas

promessas. Quando Deus chama um filho da Aliança na

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Os Cânones de Dort

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infância devemos confiar que Deus completou a sua redenção

naquele infante membro da sua Congregação e que aquele foi

o melhor tempo para ser recolhido à eternidade.

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Artigo 18 – Não protesto, mas sim adoração

Aos que se queixam da graça da eleição imerecida e da

severidade da reprovação justa, replicamos com as palavras do

apóstolo: “Quem és tu, ó homem, para discutires com Deus” (Rom.

9.20), e com estas palavras do nosso Salvador: “Porventura, não

me é lícito fazer o que quero do que é meu?” (Mat. 20.15).

Nós, porém, adorando com reverência esses mistérios,

exclamamos com o apóstolo: “Ó profundidade da riqueza, tanto da

sabedoria como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus

caminhos! Quem, pois, conheceu a mente do Senhor? Ou quem foi o seu

conselheiro? Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas.

A ele, pois, a glória eternamente. Amém” (Rom. 11.33-36).

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Comentário: Somos criaturas e nenhuma criatura pode

sequer imaginar compreender tudo do Criador, porque ele é

ilimitado e infinito, e ao contrário, todas as suas criaturas são

naturalmente limitadas e finitas. Sendo homens e habitando

neste mundo onde o pecado entrou através de Adão, temos a

agravante da queda; assim, somos criaturas e caídas, pecadores

corruptos e depravados. Tudo em nós foi contaminado pelo

pecado: nosso corpo, nossa mente, vontade, emoções. Com

todo esse know-how jamais poderíamos compreender

qualquer mistério de Deus, a não ser que ele mesmo remova

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Os Cânones de Dort

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as trevas da nossa mente. Então, diante daquilo que não

podemos alcançar, é sábio, nos prostrar humildemente e

adorar ao Senhor. O mistério de Deus que não entendemos,

adoramos. A doutrina da eleição envolve a providência de

Deus, que é a maneira como ele sustém, governa e dirige toda

a sua criação para o fim decretado por ele mesmo desde a

eternidade. A premissa para cremos numa doutrina não é

apenas se a compreendemos perfeitamente, mas se Deus a

disse. Por um lado temos diante de nós o padrão da justiça de

Deus estabelecido em sua santa lei, por outro lado, vemos

nossa total incapacidade para obedecê-la, mas quando

olhamos para o alto encontramos a solução que ele mesmo

proveu para nós - a vida e a justiça de seu Filho. O crente que

recebeu a revelação e compreendeu isto, deve render-lhe

louvor e ações de graças. E ao que ouvir essa bendita doutrina

e quiser argumentar ouça: “Portanto, os meus estatutos e os meus

juízos guardareis; os quais, observando-os o homem, viverá por eles. Eu

sou o Senhor” - Levítico 18.5; “E eis que se levantou um certo doutor da

lei, tentando-o, e dizendo: Mestre, que farei para herdar a vida eterna?

E ele lhe disse: Que está escrito na lei? Como lês? E, respondendo ele,

disse: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a

tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento, e ao

teu próximo como a ti mesmo. E disse-lhe: Respondeste bem; faze isso, e

viverás” - Lucas 10.25-28. Se alguém supuser que pode fazer isso,

que tente, mas verá não pode. Quem for sábio ponha a sua

boca no pó e diga: “E não entres em juízo com o teu servo, porque à

tua vista não se achará justo nenhum vivente” - Salmo 143.2; “Ó Deus,

tem misericórdia de mim, pecador!” - Lucas 18.13.

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A morte de Cristo e a redenção do homem através

dela

Capítulo 2

Artigo 1 – O castigo que a justiça de Deus exige

Deus não é apenas supremamente misericordioso, mas

também é supremamente justo. E, conforme ele mesmo

revelou em sua Palavra, a sua justiça exige que os nossos

pecados, cometidos contra a sua infinita majestade, sejam

castigados não apenas nesta era, mas também na era porvir,

tato no corpo quanto na alma. Não podemos escapar desse

castigo, a menos que a justiça de Deus seja satisfeita.

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Comentário: Parece que a justiça e a misericórdia são

irreconciliáveis. Como pode Deus ser justo e justificador a um

só tempo? Como um justo juiz pode justificar um réu que

deveria ser condenado? O próprio Deus diz: “porque não

justificarei o ímpio”; ele também garantiu “… que ao culpado não tem

por inocente; que visita a iniquidade dos pais sobre os filhos e sobre os

filhos dos filhos até à terceira e quarta geração” - Êxodo 23.7; 34.7.

Contudo, o apóstolo Paulo nos ensinou que Deus justifica o

ímpio, quando disse: “Para demonstração da sua justiça neste tempo

presente, para que ele seja justo e justificador daquele que tem fé em

Jesus” - Romanos 3.26; e, “Mas, àquele que não pratica, mas crê

naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é imputada como justiça” -

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Romanos 4.5. Pela ótica e observação humana parece uma

contradição, mas há uma explicação. A única maneira de Deus

ser justo e também justificador seria cobrando de Outro a

nossa dívida. Para que ele pudesse nos justificar, Alguém

deveria sofrer a nossa penalidade. Esse Outro foi Jesus Cristo

- “Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as

nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de

Deus, e oprimido. Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões,

e moído por causa das nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz

estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados Isaías” - 53.4-5.

Ele recebeu sobre si a punição que a nós estava imposta pela

justiça de Deus. Por isso se diz que aquele que foi justificado

por Deus jamais será condenado, porque isso seria cobrar

duas vezes a mesma dívida - “Havendo riscado a cédula que era

contra nós nas suas ordenanças, a qual de alguma maneira nos era

contrária, e a tirou do meio de nós, cravando-a na cruz” – Colossenses

2.14. Contudo, aquele que não foi justificado, esse sim,

indubitavelmente será cobrado pela justiça divina, e sua dívida

é impagável.

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Artigo 2 – A satisfação cumprida por Cristo

Nós, porém, não podemos cumprir essa satisfação e nos

livrar por nós mesmos da ira de Deus. Por isso Deus, em sua

infinita misericórdia, nos deu o seu Filho Unigênito como

nosso Fiador. Por nós ou em nosso lugar, ele foi feito pecado

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e maldição na cruz para que pudesse, em nosso favor,

satisfazer a Deus.

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Comentário: Não foi o caso que Deus fez vistas grossas

para com os nossos pecados. De maneira nenhuma; Ele não

podia simplesmente nos perdoar. Alguns supõem que para

Deus, perdoar é muito fácil, e que simplesmente, querendo

ele, deixa de lado os nossos pecados. Não, não é assim.

Alguém já disse que para Deus foi muito fácil criar o mundo,

pois sendo Onipotente, foi apenas falando e tudo veio à

existência. O homem ele o fez com o pó da terra e lhe soprou

o espírito de vida. Tudo isso para Deus foi fácil. Mas, a

redenção – que é a segunda criação – essa foi a coisa mais

custosa para Deus, porque a redenção envolvia derramamento

de sangue e o único sangue que tinha a qualidade exigida pela

justiça eterna era o do Filho eterno, que se tornou o Cordeiro

de Deus. A maldição da queda que pesava sobre nós recaiu

sobre Cristo na cruz - “Cristo nos resgatou da maldição da lei,

fazendo-se maldição por nós; porque está escrito: Maldito todo aquele

que for pendurado no madeiro” - Gálatas 3.13. O preço não poderia

ser mais elevado e difícil, mas Deus manifestou e revelou

nisso seu amor eterno pelos eleitos - “Mas Deus prova o seu amor

para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores”

- Romanos 5.8. O preço da nossa redenção foi pago

inteiramente pelo nosso Fiador - “De tanto melhor aliança Jesus

foi feito fiador” - Hebreus 7.22.

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Artigo 3 – O valor infinito da morte de Cristo

A morte do Filho de Deus é o único e o mais perfeito

sacrifício e satisfação pelos pecados, de valor e mérito

infinitos, e abundantemente suficiente para expiar os pecados

do mundo inteiro.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: Para reverter os efeitos do pecado e da

queda da humanidade, a mesma justiça de Deus exigia um

sacrifício de valor infinito e eterno. Para que o homem fosse

liberto da culpa, da escravidão, e também um dia da presença

do pecado, seria necessário um sacrifício, digamos

extraterreno, cujo efeito se sobrepusesse ao tempo e cuja

eficácia adentrasse o santuário celestial. Naturalmente que um

sacrifício assim só poderia ser feito pelo próprio Deus. Assim,

se o nosso Fiador tinha que ser um homem para ser o

representante da nossa raça, tinha também que ser Deus para

oferecer um sacrifício infinito e eterno. Então Deus entrou na

humanidade através de seu Filho. O Criador vestiu-se de

criatura, para redimir dentre as suas criaturas, aqueles que

dantes havia escolhido para com ele habitar. Essa é a

maravilhosa história da redenção. Jesus morreu por nós; seu

sacrifício é suficiente para o mundo inteiro, todavia eficiente

só para os eleitos, pois esses são os que creem. Há suficiência

para salvar todos quantos vierem a Cristo, trazidos pelo Pai -

“E ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos,

mas também pelos de todo o mundo” - 1ª João 2.2. A morte de

Cristo incluiu todos os eleitos de Deus de todos os lugares e

de todos os tempos. Os crentes do Antigo Testamento foram

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salvos pela eficiência do sangue de Cristo tanto quanto os

crentes do Novo Testamento. Isso porque esse sangue foi

conhecido desde a fundação do mundo - “Sabendo que não foi

com coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados da

vossa vã maneira de viver que por tradição recebestes dos vossos pais,

Mas com o precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro imaculado e

incontaminado, O qual, na verdade, em outro tempo foi conhecido,

ainda antes da fundação do mundo, mas manifestado nestes últimos

tempos por amor de vós” - 1ª Pedro 1.18-20. Nossa redenção foi

feita pelo sangue do Cordeiro de Deus que veio para tirar o

pecado do mundo. Amém.

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Artigo 4 – Por que a morte de Cristo tem valor

infinito?

A morte do Filho de Deus tem tão grande valor e mérito

porque aquele que se submeteu a ela não é apenas o homem

perfeito e verdadeiro, mas é também o Filho Unigênito de

Deus, da mesma essência eterna e infinita com o Pai e o

Espírito Santo, pois tais qualificações era necessárias para o

nosso Salvador. Além disso, essa morte tem tão grande valor e

mérito porque foi acompanhada da consciência da ira e da

maldição de Deus que, por causa dos nossos pecados, somos

merecedores.

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Comentário: Todos os sacrifícios feitos pelos sacerdotes

na Antiga Aliança eram apenas figuras e tipos que apontavam

para Cristo, e portanto, precisavam ser repetidos e repetidos

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todos os dias - “E assim todo o sacerdote aparece cada dia,

ministrando e oferecendo muitas vezes os mesmos sacrifícios, que nunca

podem tirar os pecados” - Hebreus 10.11. Mas o sacrifício que o

Senhor Jesus, sendo o sacerdote eterno e também o Cordeiro

de Deus, fez oferecendo-se a si mesmo, foi único e de uma

vez para sempre - “Mas este, havendo oferecido para sempre um

único sacrifício pelos pecados, está assentado à destra de Deus” -

Hebreus 10.12. Na cruz do Calvário, o Senhor Jesus sorveu até a

última gota do cálice da ira de Deus, que estava reservado a

nós. Ele não foi poupado pelo Pai; não ficou mais em conta

por ser ele o Filho Amado; não houve desconto por pagar

uma dívida de terceiros. De fato o Senhor Jesus sofreu

totalmente a penalidade do nosso pecado, pois não havia

outro meio de sermos salvos da condenação. Então o Senhor

sofreu os terrores da morte e do inferno na cruz, onde

experimentou o que significa ser abandonado por Deus e

estar totalmente desamparado e desassistido da Graça do Pai.

Aquilo que é o inferno, ele o experimentou na cruz - ou seja,

uma total e completa ausência da graça de Deus e uma

sensível e aterrorizadora presença da ira de Deus - “Os cordéis

da morte me cercaram, e angústias do inferno se apoderaram de mim;

encontrei aperto e tristeza” - Salmo 116.3. O Pai não pode

contemplar seu Filho Unigênito sendo submetido aquele

terrível sacrifício, sendo chagado e moído pelos nossos

pecados, por isso Jesus clamou: “… Eloí, Eloí, lamá sabactani?

que, traduzido é: Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?” -

Marcos 15.34. Tudo isso tornou o sacrifício de Jesus, único,

insubstituível, suficiente e poderosamente eficiente para

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reverter todos os efeitos catastróficos da queda. Um dia

veremos a plenitude da remissão - “Descobrindo-nos o mistério da

sua vontade, segundo o seu beneplácito, que propusera em si mesmo,

de tornar a congregar em Cristo todas as coisas, na dispensação da

plenitude dos tempos, tanto as que estão nos céus como as que estão na

terra” - Efésios 1.9-10.

--------------------------------------------------------------------------

Artigo 5 – A proclamação universal do evangelho

A promessa do evangelho é que todo aquele que crer em

Cristo crucificado não perecerá, mas tem a vida eterna. Essa

promessa deve ser anunciada e proclamada universalmente e

sem nenhuma discriminação a todos os povos e homens, aos

quais Deus, em seu beneplácito, envia o evangelho juntamente

com o mandamento de que se arrependam e creiam.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: Alguns objetam que, se os eleitos serão

salvos indiscutivelmente, então independente da igreja pregar

ou não o evangelho, isso ocorrerá. Já, os que não são eleitos,

não serão salvos, também independentemente da pregação do

evangelho. Bem, que aqueles que Deus escolheu na eternidade

ele mesmo os atrairá para si e apenas esses serão trazidos a

ele, é um fato inegável e inequívoco. Contudo, o Senhor nos

ordenou pregar o evangelho a toda criatura, porque,

absolutamente, não cabe a nós julgar quem é ou quais são os

que devem ouvir e quais não. Primeiro que “... aprouve a Deus

salvar os crentes pela loucura da pregação” - 1ª Coríntios 1.21. Segundo

que mesmo onde Deus não irá salvar, a pregação do

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evangelho acrescenta condenação aos que ouvem e rejeitam.

Por isso ele nos ordena pregar o evangelho a todos,

indistintamente. Que todos ouçam, seja para a salvação ou

para a condenação, Deus será sempre glorificado, tanto nos

que se salvam quanto nos que se perdem - “Porque para Deus

somos o bom perfume de Cristo, nos que se salvam e nos que se perdem.

Para estes certamente cheiro de morte para morte; mas para aqueles

cheiro de vida para vida” - 2ª Coríntios 2.15-16. “Ide por todo o mundo”

disse o Senhor, e “pregai o evangelho a toda criatura. Quem crer e for

batizado será salvo; mas quem não crer será condenado” - Marcos

16.15-16. À igreja cabe pregar e chamar os pecadores ao

arrependimento - “Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado

em nome de Jesus Cristo, para perdão dos pecados; e recebereis o dom do

Espírito Santo” - Atos 2.38; devemos obedecer a ordem do

Senhor de pregar a toda a criatura e crer que o Espírito Santo

chamará os eleitos de Deus. Os eleitos creem porque junto

com a pregação Deus lhes dá a fé e o arrependimento.

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Artigo 6 – Por que alguns não creem?

No entanto, muitos dos que foram chamados pelo

evangelho não se arrependem nem creem em Cristo, mas

perecem na incredulidade. Isso não acontece por haver algum

defeito ou insuficiência no sacrifício de Cristo oferecido na

cruz, mas pela própria culpa deles.

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Comentário: A proclamação da glória de Deus está por

toda a parte do mundo, tornando os homens indesculpáveis.

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Eles nascem com o senso do certo e do errado, do bem e do

mal, gravado em suas almas. Toda a criação de Deus ao seu

redor revela o poder, a majestade e a glória divinas, chamando

o homem à contemplação e adoração do Criador. Isso por si

só torna os pecadores inexcusáveis perante o tribunal de

Deus. Quando rejeitam abertamente o chamado de Deus

através de Cristo em sua Igreja, nada mais lhes resta senão a

condenação eterna. Os que têm a oportunidade de ouvir o

chamado do evangelho e não creem serão mais

merecidamente deixados em seus pecados. Isto já foi

anunciado pelo Senhor - “Porque muitos são chamados, mas poucos

escolhidos” - Mateus 22.14. Outros há que nem mesmo tiveram

essa oportunidade, mas foram impedidos de ouvir - “E,

passando pela Frígia e pela província da Galácia, foram impedidos pelo

Espírito Santo de anunciar a palavra na Ásia” - Atos 16.6, viveram

na escuridão sem nada conhecer do evangelho da glória de

Deus - “O qual nos tempos passados deixou andar todas as nações em

seus próprios caminhos” - Atos 14.16. Em todos esses,

misteriosamente, a justiça de Deus será glorificada. De

qualquer forma é muito justo que os pecadores sejam

abandonados em seus próprios pecados e condenados ao

inferno, e é demonstração de misericórdia e generosidade que

Deus salve aqueles a quem quer. Se Deus abandonasse Adão e

toda sua família em seus pecados, faria isto com toda justiça.

Contudo, ele decretou salvar apenas uma parte dela,

reconduzindo-os à sua presença, e deixar que os demais

permaneçam na queda eternamente. Aqueles que decretou

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salvar Deus mesmo dá a fé e o arrependimento, e apenas

esses creem e se arrependem.

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Artigo 7 – Por que outros creem?

Mas aqueles que verdadeiramente creem e pela morte de

Cristo são libertos e salvos dos seus pecados e da perdição,

recebem esse benefício apenas por causa da graça de Deus

que lhes é dada em Cristo, desde a eternidade. Deus não deve

tal graça a ninguém.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: Deus nunca deixou os homens

completamente sem seu testemunho. Como já havíamos visto,

por toda a criação há uma proclamação silenciosa das obras

de Deus, revelando seu poder, sua majestade e sua glória,

conclamando o homem à contemplação do Criador - “Os céus

declaram a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas

mãos. Um dia faz declaração à outro dia, e uma noite mostra sabedoria

à outra noite. Não há linguagem nem fala onde não se ouça a sua voz.

A sua linha se estende por toda a terra, e as suas palavras até ao fim

do mundo” - Salmo 19.1-4. Contudo, ainda assim os homens não

vão a ele. A fé não é de todos, não é inata ao ser humano;

nem mesmo todos aqueles que ouvem o evangelho o

abraçam, isto porque crer em Deus é um dom que nem todos

recebem, mas apenas aqueles destinados a crer. Por isso

lemos: “E os gentios, ouvindo isto, alegraram-se, e glorificavam a

palavra do Senhor; e creram todos quantos estavam ordenados para a

vida eterna… Querendo ele passar à Acaia, o animaram os irmãos, e

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escreveram aos discípulos que o recebessem; o qual, tendo chegado,

aproveitou muito aos que pela graça criam” - Atos 13.48; 18.27. Énos dito algo maravilhoso e misterioso sobre aqueles que

creram: “estavam ordenados para a vida eterna”. O dom da fé vem

pelo ouvir a Palavra de Deus - “Porque pela graça sois salvos, por

meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus” - Efésios 2.8. Mas

só recebem esse dom aqueles a quem Deus escolheu. Esses

ouvem, creem, atendem, vão a ele e o seguem em obediência.

Em sua infinita sabedoria Deus fez com que o crer fosse

assim: Ele concede o dom e o homem crê. Assim, todos os

homens, de alguma forma, são chamados a crer e são

responsabilizados se permanecerem em sua incredulidade e

desobediência. Cada pessoa que está no céu tem a plena

consciência que jamais mereceu estar ali, mas lá está pelos

preciosos dons que Deus lhe deu. Já cada pessoa que está no

inferno tem a mais perfeita consciência de que lá está, única e

exclusivamente, pelos seus próprios pecados, por sua própria

culpa e merecimento por não fazer caso do chamado de Deus.

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Artigo 8 – A eficácia da morte de Cristo

Este, pois, foi o soberano conselho de Deus, o Pai: que a

eficácia salvadora e vivificante da preciosíssima morte do seu

Filho se estendesse a todos os eleitos. Foi da sua graciosíssima

vontade e intento conceder a fé justificadora apenas a eles e

assim trazer-lhes infalivelmente à salvação. Isto é: Deus quis

que Cristo, pelo sangue derramado na cruz (pelo qual ele

confirmou a nova aliança), redimisse, eficazmente, de todo

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Os Cânones de Dort

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povo, tribo, nação, e língua, todos aqueles – e somente aqueles

– que, desde a eternidade, foram eleitos para a salvação e

foram dados ao Filho pelo Pai. Deus também quis que Cristo

lhes desse a fé, que, juntamente com outros dons salvadores

do Espírito Santo, adquiriu para eles pela sua morte, para que

pelo seu sangue pudesse purificá-los de todos os seus pecados

– tanto do pecado original quanto dos pecados reais

cometidos antes e depois da fé – e para os guardar fielmente

até o fim e, finalmente, os apresentar a si mesmo em glória,

sem nenhuma mácula ou ruga.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: Nos seus eleitos, Deus age com um poder

soberano, porém gracioso, conhecido como a graça

irresistível, a qual é infalível, pois age num recôndito mais

secreto do nosso ser que só o próprio Deus conhece e

ninguém mais, nem nós mesmos. Ali, ele planta o

arrependimento e a fé, e muda a inclinação do nosso ser e nos

leva a amar, crer, confiar e desejar a Cristo como nosso

Senhor e Salvador. O Espírito Santo só revela Cristo àqueles

que ele também regenerou. Resumindo, o eleito é salvo

porque Deus quis salvá-lo, e Deus faz isto para a sua própria

glória. De modo que a eficácia da redenção de Cristo é total e

absoluta na vida de cada eleito de Deus. Por isso cremos que a

expiação de Cristo é exclusiva aos eleitos de Deus. Quando

um rei expulsa um súdito de sua presença, tal pessoa morrerá

no exílio, a menos que o rei use de misericórdia e o perdoe e

chame de volta à sua presença. O pecador é um exilado da

presença do Rei; alguns são reconciliados e trazidos de volta

outros não. Só assim podemos entender a oração de Cristo:

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Os Cânones de Dort

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“Eu rogo por eles; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste,

porque são teus” - João 17.9. Mas todos os eleitos de Deus, de

todos os lugares, de todos os tempos são, inequívoca e

infalivelmente redimidos pela morte de Jesus Cristo. Deus

escolheu antes da fundação do mundo, um povo, não apenas

dentre os filhos naturais de Abraão, mas dentre todas as

nações da terra, para levar ao céu e um dia povoar a nova

terra e novos céus - “E cantavam um novo cântico, dizendo: Digno

és de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque foste morto, e com o

teu sangue compraste para Deus homens de toda a tribo, e língua, e

povo, e nação”…. “Depois destas coisas olhei, e eis aqui uma multidão, a

qual ninguém podia contar, de todas as nações, e tribos, e povos, e

línguas, que estavam diante do trono, e perante o Cordeiro, trajando

vestidos brancos e com palmas nas suas mãos” - Apocalipse 5.9; 7.9. À

esses a salvação não é proposta ou oferecida apenas mas

executada graciosamente por obra do Espírito Santo, desde o

chamamento até a glorificação, passando pela justificação e

santificação.

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Artigo 9 – O cumprimento do conselho de Deus

Esse conselho, que procede do amor eterno de Deus

pelos eleitos, tem sido poderosamente cumprido desde a

fundação do mundo até o momento presente, e ainda

continuará a ser cumprido, mesmo que as “portas do inferno”

tentem, inutilmente, frustrá-lo. No devido tempo, os eleitos

serão reunidos e sempre existirá uma igreja de crentes,

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fundada no sangue de Cristo. Essa igreja deve amá-lo

firmemente e servi-lo fielmente como seu Salvador (o qual

como Noivo derramou a sua vida na cruz pela sua Noiva) e

celebrar os seus louvores aqui e por toda a eternidade.

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Comentário: Os planos e decretos de Deus não podem

ser frustrados. Seu Conselho permanece firme e ele fará tudo

quanto desejou fazer. A Igreja é a edificação dos crentes, em

Cristo, feita por ele próprio - “Pois também eu te digo que tu és

Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do

inferno não prevalecerão contra ela” - Mateus 16.18. Sendo assim,

nada poderá impedir que os fiéis continuem congregando,

para adorar ao Senhor que por eles morreu. Enquanto houver

uma única ovelha do Senhor para ser atraída para Cristo, o

Espírito Santo continuará sua obra na terra, pois nenhuma

delas poderá faltar até o último dia. Todos os filhos de Deus

devem ser reunidos conforme está escrito - “… sendo o sumo

sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus devia morrer pela nação. E

não somente pela nação, mas também para reunir em um corpo os

filhos de Deus que andavam dispersos” - João 11.51-52. O próprio

Senhor Jesus assegurou que ainda tinha outras ovelhas fora do

redil judaico e que iria agrega-las - “Ainda tenho outras ovelhas

que não são deste aprisco; também me convém agregar estas, e elas

ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um Pastor” - João 10.16.

Por isso a ordem para seus discípulos era sair por todo o

mundo a partir de Jerusalém até aos confins da terra,

chamando os pecadores a fé e ao arrependimento - “Mas

recebereis a virtude do Espírito Santo, que há de vir sobre vós; e ser-me50

Os Cânones de Dort

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eis testemunhas, tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria,

e até aos confins da terra” - Atos 1.8. Deve haver muitos eleitos

que ainda não nasceram, pelo que os filhos da aliança devem

continuar se procriando, pois esses eleitos precisam vir a este

mundo. Deus os têm em todos os lugares e especialmente nos

lares dos seus filhos, as famílias da aliança.

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A corrupção do homem, a sua conversão a Deus, e

o modo como isso ocorre

Capítulos 3 e 4

Artigo 1 – O resultado da queda

No princípio, o homem foi criado à imagem de Deus.

Foi adornado em seu entendimento com o verdadeiro e total

conhecimento do seu Criador e de todas as coisas espirituais.

A sua vontade e o seu coração eram retos; todos os seus

sentimentos, puros; o homem era, portanto, completamente

santo.

Mas, ao rebelar-se contra Deus pela instigação do diabo

e pelo livre-arbítrio, ele se privou desses dons excelentes e, em

lugar deles, trouxe sobre si cegueira, densas trevas, futilidade e

perverso juízo em sua mente; malignidade, rebelião e

obstinação com sua vontade e coração; e impureza em todos

os seus sentimentos.

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Comentário: Antes da queda o homem era um ser

perfeito e santo, como Deus o fez. Tudo nele estava em

ordem: sua mente, vontade e emoções eram justos; seus

afetos e inclinações eram bons, e tudo operava no mais

perfeito equilíbrio. O próprio Deus, ao terminar a criação,

atestou e aprovou tudo quanto havia criado. Disse que tudo

quanto havia feito era muito bom - “E criou Deus o homem à sua

imagem; à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou... E viu

Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom...” - Gênesis 1.27,

31. Após a queda, porém, toda a criação foi afetada pelo mal e

aquela perfeição que havia no homem, foi danificada; todo o

seu ser foi contaminado pelas radiações corruptivas do

pecado. Design original foi afetado, tornando-o

desequilibrado emocionalmente, dominado pelas paixões e

apetites sensuais; tristemente o caos foi instalado com

sucesso. “E viu o SENHOR que a maldade do homem se multiplicara

sobre a terra e que toda a imaginação dos pensamentos de seu coração

era só má continuamente. Então arrependeu-se o SENHOR de haver

feito o homem sobre a terra e pesou-lhe em seu coração” - Gênesis 6.5-6.

O pecado trouxe-lhe trevas que lhe obscureceram a mente,

deixando-o cegado em seu entendimento e escravo do

pecado: “e o seu coração insensato se obscureceu” - Romanos 1.21.

Essa é a condição em que o pecado deixou os descentes de

Adão: “Entenebrecidos no entendimento, separados da vida de Deus” -

Efésios 4.18. Foi uma grande tragédia; de fato, a maior de toda

a história da humanidade. O próprio nome já diz: Queda; o

homem caiu. Caiu de um estado de glória para a corrupção e

depravação. Isso por si só desmente a teoria da evolução, que

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afirma ser o homem um primata evoluído. Não, o homem

não é um antropoide evoluído, mas sim o que sobrou de uma

criatura que Deus fez com suas próprias mãos e nela

imprimiu sua imagem e insuflou-lhe o fôlego da vida. Sim,

somos o que restou daquilo que era a coroa da criação de

Deus; degenerados pelos desastrosos efeitos da desobediência

do nosso representante federal – Adão. É isso que é o homem

– um ser involuído, isto é caído de um estado glorioso para

um estado deplorável de miséria pecaminosa. O homem caiu

e continua caindo até chegar no fundo do colossal abismo que

está sob seus pés. Somente a mão amorosa do Senhor Jesus

pode deter essa queda.

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Artigo 2 – A propagação da corrupção

Depois da queda, o homem se tornou corrompido e,

como pai corrompido, gerou filhos corrompidos. Assim, de

acordo com o justo juízo de Deus, a corrupção propagou-se

de Adão a todos os seus descendentes – à exceção de Cristo

somente – não por imitação, como afirmavam os antigos

Pelagianos, mas pela propagação de uma natureza pervertida.

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Comentário: A desobediência de Adão foi um

monstruoso insulto a Deus, à sua santidade, à sua glória, ao

seu trono e autoridade. Foi uma quebra e rompimento de

aliança e alta traição, que deveria ser punida com a pena

máxima – morte temporal e eterna. Foi uma verdadeira

tragédia, porque o pecado entrou não apenas em Adão, mas,

segundo o justo juízo de Deus, alastrou-se por sua

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descendência a dentro. O pecado de Adão tornou-se o pecado

original de todos os homens. Cada descendente de Adão já

nasce em pecado, e como “o salário do pecado é a morte” -

Romanos 6.23, cada bebezinho que vem a este mundo, nasce

condenado à morte; literalmente nasce para morrer. A prova

que todos pecaram é que todos morrem. Essa é uma

estatística infalível e terrivelmente comprovada: para cada

filho de Adão que nasce, morre um. O apóstolo Paulo disse:

“Portanto, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo

pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens por

isso que todos pecaram” - Romanos 5.12. E por isso é que todos

morrem. A porta de entrada da morte neste mundo foi o

pecado de Adão. É o princípio da solidariedade. Somos

solidários ao nosso cabeça federal e tudo o que ele fez é como

se nós próprios o fizéssemos, de forma que seu pecado se

tornou de todos nós. Nossos filhos não conhecem o pecado

conforme vão crescendo neste mundo, mas já trazem dentro

de si o pecado original. Aliás essa é a única coisa que

trouxemos a este mundo: o pecado, e precisamos deixá-lo

aqui quando daqui sairmos. Essa é a maravilhosa proposta do

Evangelho: Livrar-nos da escravidão do pecado. “Respondeulhes Jesus: Em verdade, em verdade vos digo que todo aquele que comete

pecado é servo do pecado... Se, pois, o Filho vos libertar,

verdadeiramente sereis livres” - João 8.34, 36.

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Artigo 3 – A total incapacidade do homem

Portanto, todos os homens são concebidos em pecado e

nascem como filhos da ira, incapazes de realizar qualquer bem

salvífico, inclinados para o mal, mortos em pecados e escravos

do pecado. Sem a graça da regeneração do Espírito Santo, não

desejam nem podem voltar-se para Deus, nem corrigir a sua

natureza depravada, nem se preparar para essa correção.

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Comentário: Desde que o homem decaiu da gloriosa

posição na qual havia sido colocado quando criado, passou

também a fugir continuamente de Deus. Cheio de culpa,

vergonha, medo, mas orgulhoso demais para admiti-lo; em

vez de correr para Deus, que é a luz e a vida, onde encontraria

o perdão, ele correu afoitamente na direção oposta. Assim

continuará até desaparecer completamente nas trevas eternas,

de onde nunca sairá nem jamais tornará a ver a luz,

eternamente. Na condição de criatura caída e contaminada

pelo pecado, o homem não tem desejo pela comunhão com

Deus. O pecado entrou em seu sistema e o viciou de tal

maneira que a única coisa que sabe fazer com grande

propriedade é pecar e afastar-se cada vez mais do Bendito

Criador. Ele é viciado e escravizado pelo pecado, de modo

que é este quem governa sua vida, intoxicando-o mais e mais

com seu veneno, e tirando dele qualquer desejo por Deus

mesmo. Foi o Senhor Jesus que fez tal observação – quase um

lamento: “E não quereis vir a mim para terdes vida” - João 5.40.

Assim, o pecador está nas trevas e não tem desejo de vir para

a luz que Deus é - “E a condenação é esta: Que a luz veio ao mundo,

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e os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque as suas obras

eram más. Porque todo aquele que faz o mal odeia a luz, e não vem

para a luz, para que as suas obras não sejam reprovadas” - João 3.19-

20. O homem natural é carnal e jamais deixará de sê-lo senão

por um milagre do Espírito de Deus recriando-o e dando-lhe

o novo nascimento - “Porque Deus, que disse que das trevas

resplandecesse a luz, é quem resplandeceu em nossos corações, para

iluminação do conhecimento da glória de Deus, na face de Jesus Cristo” -

2

a

 Coríntios 4.6. O pecador só se tornará um novo homem,

num homem espiritual quando for regenerado pelo Espírito

Santo - “Jesus respondeu: Na verdade, na verdade te digo que aquele

que não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de

Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é

espírito” - João 3.5-6. Por si mesmo o pecador não pode

corrigir-se a si próprio e nem mesmo contribuir ou prepararse para uma eventual correção. Nos que foram eleitos para a

salvação, essa regeneração é operada por Deus, e Deus a

opera sozinho, sem a participação do homem, uma vez que

este está morto no pecado.

--------------------------------------------------------------------------

Artigo 4 – A insuficiência da luz da natureza

Com certeza, depois da queda restou no homem um

pouco da luz natural, pela qual ele ainda conserva algumas

noções sobre Deus, sobre as coisas naturais, e sobre a

diferença entre o que é honrável e o que é vergonhoso, e

mostra alguma consideração pela virtude e pela ordem

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exterior. Mas está tão longe de chegar ao conhecimento

salvador de Deus e da verdadeira conversão por meio dessa

luz da natureza, que nem mesmo a usa do modo apropriado

nas questões naturais e civis. Antes, não importa o que seja

essa luz, o homem a polui completamente de várias formas e

a suprime pela sua injustiça, tornando-se assim inescusável

diante de Deus.

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Comentário: Esse documento afirma que o homem

natural tem luz suficiente para torná-lo indesculpável diante

do tribunal de Deus, mas não tem iluminação suficiente para

guiá-lo à salvação, a menos que Deus se revele a ele. O

apóstolo Paulo disse que todos são indesculpáveis diante de

Deus - “Porquanto o que de Deus se pode conhecer neles se manifesta,

porque Deus lho manifestou. Porque as suas coisas invisíveis, desde a

criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se

entendem, e claramente se veem pelas coisas que estão criadas, para que

eles fiquem inescusáveis” - Romanos 1.19-20. A queda não apagou

de todo daqueles dons magníficos que ele possuía antes de

desobedecer a Deus e dar ouvidos à velha serpente. Por isso o

próprio apóstolo diz: “Porque, quando os gentios, que não têm lei,

fazem naturalmente as coisas que são da lei, não tendo eles lei, para si

mesmos são lei; Os quais mostram a obra da lei escrita em seus corações,

testificando juntamente a sua consciência, e os seus pensamentos, quer

acusando-os, quer defendendo-os” - Romanos 2.14-15. Isto é, mesmo

aqueles que não conhecem e nem temem a Deus, têm alguma

noção de certo e errado, justo e injusto, honroso e

vergonhoso. Contudo essa luz que têm é insuficiente para

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atraí-los a Cristo para serem salvos. E como, sem Deus, eles

não podem fazer outra coisa senão pecar, é isso que fazem,

acabando por eclipsar totalmente essa luz com sua corrupção

pessoal. Os ímpios costumam culpar Deus acusando-o de

injustiça por não revelar-se a todos os homens. Sendo Deus

absolutamente justo e também misericordioso, para com os

incrédulos e desobedientes ele mostra verdadeira justiça, e

para com os crentes ele mostra misericórdia. Logo, não faz

injustiça a ninguém - “Aos justos nasce luz nas trevas; ele é piedoso,

misericordioso e justo” - Salmo 112.4.

--------------------------------------------------------------------------

Artigo 5 – A insuficiência da Lei

Aquilo que se afirma da luz da natureza também é válido

para os Dez Mandamentos, dados por Deus através de

Moisés, particularmente aos judeus. Embora a Lei revele a

grandeza do pecado e cada vez mais convença o homem da

sua culpa, ainda assim não lhe aponta a cura nem lhe dá poder

para se erguer e sair das suas misérias. Antes, enfraquecida

pela carne, a Lei deixa o transgressor debaixo de maldição.

Por essa causa, o homem não pode obter a graça salvadora

através da Lei.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: Sozinha a lei também é insuficiente para

trazer salvação ao pecador, porque ela projeta verdadeira luz

sobre o pecado, contudo não capacita o homem para vencêlo. Ela diagnostica a enfermidade humana mas não medica o

moribundo, deixando-o desesperançado e confinado à morte

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- “Ora, nós sabemos que tudo o que a lei diz, aos que estão debaixo da

lei o diz, para que toda a boca esteja fechada e todo o mundo seja

condenável diante de Deus. Por isso nenhuma carne será justificada

diante dele pelas obras da lei, porque pela lei vem o conhecimento do

pecado” - Romanos 3.19-20. A lei revela o altíssimo padrão da

justiça de Deus e exige obediência irrestrita, amaldiçoando

toda desobediência. Como o homem é totalmente incapaz por

si mesmo de cumpri-la, fica imobilizado debaixo da sua

sentença condenatória - “Maldito aquele que não confirmar as

palavras desta lei, não as cumprindo” - Deuteronômio 27.26. Assim,

se Deus nos desse apenas a sua Lei mas não revelasse sua

misericórdia e graça, ninguém seria salvo. O apóstolo Paulo

disse: “Todos aqueles, pois, que são das obras da lei estão debaixo da

maldição; porque está escrito: Maldito todo aquele que não permanecer

em todas as coisas que estão escritas no livro da lei, para fazê-las” -

Gálatas 3.10. E Tiago completa: “Porque qualquer que guardar toda

a lei, e tropeçar em um só ponto, tornou-se culpado de todos” - Tiago

2.10. Ninguém teria alguma chance de escapar da maldição da

Lei, se não fora a graça inefável de Deus revelada em Cristo

Jesus. Bendito seja Deus que não deixou a Lei sozinha, antes

ela está bem acompanhada da sua maravilhosa graça. Eis a

nossa bendita ventura - a Lei nos inclina para a Graça que está

em Cristo Jesus - “De maneira que a lei nos serviu de aio, para nos

conduzir a Cristo, para que pela fé fôssemos justificados - Gálatas 3.24.

Então a lei não salva mas faz o pecador procurar o Mediador

da Aliança.

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Artigo 6 – A necessidade do Evangelho

Portanto, aquilo que nem a luz da natureza nem a Lei

podem fazer, Deus realiza pelo poder do Espírito Santo

através da palavra ou ministério da reconciliação, que é o

evangelho do Messias, pelo qual agradou a Deus salvar os que

creem, tanto na antiga quanto na nova dispensação.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: Para que o homem seja atraído para Cristo

e assim ser reconciliado com Deus é preciso um milagre: o

novo nascimento. Uma nova criação precisa ser feita, um

novo homem trazido à existência. O Senhor Jesus explicou

dessa forma a Nicodemos, um príncipe dos judeus: “Na

verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo, não

pode ver o reino de Deus. Disse-lhe Nicodemos: Como pode um homem

nascer, sendo velho? Pode, porventura, tornar a entrar no ventre de sua

mãe, e nascer? Jesus respondeu: Na verdade, na verdade te digo que

aquele que não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino

de Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do

Espírito é espírito. Não te maravilhes de te ter dito: Necessário vos é

nascer de novo” - João 3.3-7. Tanto no Antigo quanto no Novo

Testamento o caminho de volta para Deus é o mesmo: a

regeneração, que consiste num novo espírito, um novo

coração, uma nova natureza - “E dar-vos-ei um coração novo, e

porei dentro de vós um espírito novo; e tirarei da vossa carne o coração

de pedra, e vos darei um coração de carne” - Ezequiel 36.26. Através

da pregação da Palavra, Deus chama o pecador à fé, ao

arrependimento de seus pecados e a sujeição ao senhorio de

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Cristo. Este foi seu método no antigo e também no novo

Testamento. Essa salvação sempre foi oferecida pela graça,

porque também ninguém, jamais, poderá ser salvo de outra

forma. De modo que nem com a luz da natureza e nem

apenas com a Lei o homem pode chegar ao conhecimento do

Salvador, mas através do chamado específico e eficaz que vem

junto com a pregação do evangelho. O apóstolo disse que

aquilo que o profeta Isaías pregou já era o evangelho: “Mas

nem todos têm obedecido ao evangelho; pois Isaías diz: Senhor, quem

creu na nossa pregação?” - Romanos 10.16. Isso confirma o

método de Deus para chamar os eleitos, a pregação: “Visto como

na sabedoria de Deus o mundo não conheceu a Deus pela sua

sabedoria, aprouve a Deus salvar os crentes pela loucura da pregação” -

1ª Coríntios 1.21. Assim com o chamado exterior do evangelho

juntamente com o chamado interior do Espírito Santo, o

pecador é trazido a Cristo. O chamado exterior entra em seus

ouvidos e o chamado interior penetra a sua alma atraindo-o

para o Salvador e reconciliado com Deus.

--------------------------------------------------------------------------

Artigo 7 – Por que o Evangelho é enviado a uns e

não a outros?

Na antiga dispensação, Deus revelou esse mistério da sua

vontade a poucos. Na nova dispensação, no entanto, ele não

considerou os povos de modo diferente e o revelou a um

número muito maior de pessoas. Não se deve atribuir a causa

dessa distribuição do evangelho ao mérito de um povo sobre

o outro, nem ao melhor uso da luz da natureza, mas ao

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beneplácito soberano e ao amor imerecido de Deus. Portanto,

nós, a quem tão grande graça é concedida, muito além e

contrária a tudo o que merecemos, devemos reconhecê-la

com coração humilde e grato. Ms quanto àqueles a quem tal

graça não é dada, devemos com o apóstolo, adorar a

severidade e a justiça dos juízos de Deus, sem de modo algum

investigá-los inquisitiva e curiosamente.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: Que Deus escolheu salvar um povo entre

toda a humanidade está muito claro em toda a Bíblia. Isso

disse o Espírito Santo pela boca do apóstolo: “Simão relatou

como, primeiramente, Deus visitou os gentios, para tomar deles um povo

para o seu nome” – Atos 15.14. Podemos ver isto deste Gênesis

até o Apocalipse, contudo, o motivo pelo qual ele o fez é

totalmente desconhecido a nós e pertence unicamente ao seu

sábio conselho e arbítrio - “As coisas encobertas pertencem ao

Senhor nosso Deus...” - Deuteronômio 29.29. Há lugares em que

nunca se ouviu a pregação do evangelho e lugares em que se

ouviu no passado e hoje não mais. Onde o evangelho é

pregado os céus estão abertos e a graça está sendo oferecida.

Mas é Deus quem envia seus mensageiros com a mensagem -

“Porque todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo. Como,

pois, invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de

quem não ouviram? E como ouvirão, se não há quem pregue? E como

pregarão, se não forem enviados?” - Romanos 10.13-15. É

prerrogativa de Deus fazer chegar sua oferta de reconciliação

onde e a quem quer. No Antigo Testamento a revelação de

Deus esteve restrita aos patriarcas e depois aos filhos de

Abraão, os israelitas. Ao redor tudo era trevas. Isto não

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significa que gentios não foram chamados também,

certamente o foram e muitos deles. Ainda assim vemos ali

uma contenção da revelação de Deus aos homens. No Novo

Testamento, com a vinda do Messias, os muros que

represavam a revelação e a graça de Deus em uma nação,

foram rompidos - “Porque ele é a nossa paz, o qual de ambos os

povos fez um; e, derribando a parede de separação que estava no meio” -

Efésios 2.14. A graça maravilhosa de Deus fluiu qual rio

caudaloso em direção a todas as nações da terra, cumprindo a

promessa anteriormente feita a Abraão - “E abençoarei os que te

abençoarem, e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; e em ti serão

benditas todas as famílias da terra… Visto que Abraão certamente virá

a ser uma grande e poderosa nação, e nele serão benditas todas as

nações da terra?” - Gênesis 12.3; 18.18. Deus assim quis fazê-lo e

assim Ele fez - “Mas o nosso Deus está nos céus; fez tudo o que lhe

agradou” - Salmo 115.3. O fato é que nenhum salvo merece sêlo, nenhum habitante do céu merece estar lá e todo

prisioneiro do inferno estará ali eternamente por sua própria

culpa, merecidamente. Além disso que nos foi revelado nas

Escrituras, não devemos investigar os mistérios de Deus,

porque aquilo que nos interessa ele no-lo revelou e nas coisas

reveladas temos motivos mais que de sobra para adorá-lo por

sua sábia justiça, bondade e misericórdia.

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Artigo 8 – O chamado sincero do Evangelho

Mas todos os que são chamados pelo evangelho,

sinceramente o são, pois Deus séria e sinceramente revela em

sua Palavra aquilo que lhe agrada, a saber, que todos os que

são chamados venham a ele. Deus também siceramente

promete o descanso para a alma e a vida eterna a todo o que a

ele vier e crer.

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Comentário: Deus não brinca com o homem, não

brinca com as almas. Quando chama o pecador ao

arrependimento, o faz mui seriamente. Todos quantos vierem

a Cristo obterão perdão e reconciliação - “Todo o que o Pai me

dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei

fora” - João 6.37. Jamais despreza ou despede vazio alguém que

se chega a ele. Por isso envia seus mensageiros com a ordem

de pregar a Palavra e com a promessa a todos quantos derem

ouvidos que receberão perdão e serão reconciliados - “Vinde a

mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei. Tomai

sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, que sou manso e humilde de

coração; e encontrareis descanso para as vossas almas” - Mateus 11.28-

29. O fato de Deus ter seus escolhidos e ter bênçãos especiais

reservadas a eles não tira, de forma nenhuma, a

responsabilidade do homem que ouve, de obedecer a sua

Palavra. O Conselho eterno reserva para si a prerrogativa de

escolher aqueles que irão habitar os novos céus e a nova terra

– e isso é mistério para nós -, mas todos os que são

chamados, o são de tal maneira que devem crer e obedecer. O

chamado externo é igual a todos. Se dez pessoas congregadas

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ouvem a pregação e o chamado, todas as dez estão de fato

tendo a oportunidade de salvação. Se apenas cinco dentre elas

derem ouvidos, vierem a Deus arrependidas de seus pecados e

perseverarem até o fim, isso significa que Deus escolheu essas

cinco, mas que também de fato o convite estava estendido às

dez.

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Artigo 9 – Por que alguns dos que são chamados

não vêm?

Muitos dos que são chamados pelo ministério do

evangelho não vêm e nem são convertidos. Mas isso não é

culpa do evangelho nem do Cristo oferecido pelo evangelho;

nem de Deus, que os chama pelo evangelho e até mesmo lhes

concede vários dons. A culpa está nos próprios pecadores.

Alguns deles não se importam com a palavra da vida nem a

aceitam. Outros, de fato, a recebem, mas não a aceitam em

seu coração e logo retrocedem depois que desaparece a alegria

de uma fé temporária. Há ainda daqueles que sufocam a

semente da Palavra com os espinhos dos cuidados e dos

prazeres deste mundo, e não produzem nenhum fruto. Esse é

o ensino do nosso Salvador na parábola do semeador.

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Comentário: Embora o chamado geral e exterior seja

sério e verdadeiro, apenas o chamado específico e interior é

eficaz. Isso porque o homem natural mesmo tendo a honra de

ser chamado por Deus não responde e nem deseja vir a Deus.

Ainda que Deus tenha a iniciativa de chamar, o homem não

tem a iniciativa de responder positivamente antes de ser

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regenerado. O pecador em seu estado caído não tem

nenhuma atração por Deus, pela sua glória, pela sua santidade,

pela sua bondade, pela sua beleza. Está, quando muito,

interessado em bênçãos materiais e imediatas, como cura

física, solução de problemas financeiros, emocionais e coisas

afins. Contudo, não tem nenhuma motivação quando o

assunto é o Reino de Deus, como devemos viver para Deus e

para sua glória. Quando se diz que muitos são chamados e

não vêm a Deus, isto quer dizer que não se rendem a Deus,

para servi-lo e viver para ele; porque muitos frequentam as

reuniões das igrejas locais, mas isso não significa que já se

deram a Cristo e a Deus. Foram chamados, sim, mas não

atenderam os termos do chamado. Muitos dos que estão na

igreja supõem que Deus, a igreja, a oração, a fé, existem para

si. Então tentam usar tudo isso em benefício próprio. Tais

pessoas não resistiriam uma perseguição religiosa, logo

desistiriam da sua crença, porque de fato não têm a fé dos

eleitos. Muitos frequentadores da igreja o fazem por

desencargo de consciência, mas trocam uma assembleia

solene por qualquer outra atividade mais atrativa para a carne.

Eles, de fato, não têm fé e qualquer coisa os desequilibra,

desanima e os leva na direção contrária. Esses são os que não

vieram a Cristo efetivamente, porque a Palavra do Senhor é: “o

que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora” - João 6.37. E

ainda: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as, e elas

me seguem; E dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e

ninguém as arrebatará da minha mão. Meu Pai, que mas deu, é maior

do que todos; e ninguém pode arrebatá-las da mão de meu Pai” - João

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10.27-29. Isto não é uma promessa apenas, mas a declaração

de um fato. O Senhor está afirmando que aquele que vem a

ele, não retrocede, não volta atrás, não recua, não se perde

jamais, porque está dito: “Nós, porém, não somos daqueles que se

retiram para a perdição, mas daqueles que creem para a conservação da

alma” - Hebreus 10.39. Amém.

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Artigo 10 – Por que outros que são chamados vêm?

Outros que são chamados pelo ministério do evangelho

vêm e são convertidos. Mas, não se deve atribuir isso ao

homem, como se ele, por causa do seu livre-arbítrio, fosse

superior àqueles que receberam igual ou suficiente graça para

a fé ou conversão (como afirma a arrogante heresia de

Pelágio). Deve-se atribuir isso a Deus, pois foi ele quem

escolheu os seus em Cristo, desde a eternidade, e os chama

eficazmente no tempo; concede-lhes a fé e o arrependimento;

livra-os do poder das trevas e os transporta para o reino do

seu Filho. Tudo isso Deus faz para que eles possam declarar

os maravilhosos feitos daquele que os chamou das trevas para

a sua maravilhosa luz, e para que não se gloriem em si

mesmos, mas no Senhor, segundo o testemunho dos

apóstolos em diversas partes da Escritura.

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Comentário: Os que ouvem o chamado do evangelho

de Cristo e vão a ele, rendem-se e passam a viver para ele em

obediência, é porque sem dúvida foram destinados a isso. O

pecador em seu estado natural não tem desejo de mudar de

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vida; ele não ama a Deus e nada que é de Deus – suas leis,

seus atributos, suas obras –, o que ele ama são as coisas que

Deus lhe pode dar, sem, contudo, interferir em sua vida. Se

lhe disserem que Deus pode curá-lo, fazê-lo feliz, prosperá-lo,

enriquecê-lo, ter sucesso, então, ele aceitará tudo isso. Mas, se

disserem que Jesus Cristo é o Senhor e deseja governar a sua

vida, então ele desiste - “Mas os seus concidadãos odiavam-no, e

mandaram após ele embaixadores, dizendo: Não queremos que este

reine sobre nós” - Lucas 19.14. Muitos aceitam quando dizemos

que Cristo morreu na cruz para nos salvar, e isto é verdade,

mas param aí; a Bíblia, porém, continua dizendo que ele

ressurgiu para ser o nosso Senhor: “Porque foi para isto que

morreu Cristo, e ressurgiu, e tornou a viver, para ser Senhor, tanto dos

mortos, como dos vivos” - Romanos 14.9. Aqueles que Jesus salva

não vivem mais para si mesmos, até porque um dos aspectos

da salvação é o livramento da nossa autonomia a qual, sendo

entregues à ela, nos levaria ao inferno - “E ele morreu por todos,

para que os que vivem não vivam mais para si, mas para aquele que

por eles morreu e ressuscitou” - 2ª Coríntios 5.15. Se salvação é não

viver mais para si mesmo e sim para Cristo, perdição é o

contrário disso. Então não importa o quão próspero e

religioso seja um homem nesta vida, se ele tiver uma vida

autônoma e independente de Cristo está condenado. Um

homem entregue a si mesmo está separado de Deus. A fé e o

arrependimento são preciosos dons de Deus àqueles que ele

destinou salvar - “Deus com a sua destra o elevou a Príncipe e

Salvador, para dar a Israel o arrependimento e a remissão dos pecados”

- Atos 5.31. Deus deu o arrependimento a Israel. O apóstolo

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orienta os presbíteros a usar a disciplina com mansidão

esperando que Deus dê o arrependimento àqueles que estão

sendo corrigidos: “Instruindo com mansidão os que resistem, a ver se

porventura Deus lhes dará arrependimento para conhecerem a verdade”

- 2ª Timóteo 2.25. Podemos ler ainda o que foi dito dos crentes

da Ásia: “Querendo ele passar à Acaia, o animaram os irmãos, e

escreveram aos discípulos que o recebessem; o qual, tendo chegado,

aproveitou muito aos que pela graça criam” - Atos 18.27. Pela graça

criam, isto é, só creem aqueles que recebem esse dom.

Resumindo, a salvação é uma obra de exclusiva de Deus, do

começo ao fim, da eleição à glorificação. Toda glória seja dele

para sempre, Amém.

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Artigo 11 – Como Deus realiza a conversão?

Deus realiza o seu beneplácito nos eleitos e opera neles a

verdadeira conversão da seguinte maneira: ele cuida para que

o evangelho lhes seja pregado e ilumina poderosamente a sua

mente pelo Espírito Santo, de modo que possam

compreender e discernir corretamente as coisas do Espírito

de Deus. Pela operação eficaz do mesmo Espírito

regenerador, ele também penetra até os recantos mais íntimos

do homem; abre os corações fechados e abranda os

endurecidos; circunda o que era incircunciso e infunde novas

qualidades na vontade; faz viver a vontade outrora morta: a

que era má, converte em boa; a indisposta, em solícita; a

rebelde, em obediente. Ele muda e fortalece de tal maneira

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essa vontade que, assim como uma árvore boa, seja capaz de

produzir o fruto das boas obras.

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Comentário: A obra do Espírito Santo em nós é tão

misteriosa que nós próprios não podemos compreender

perfeitamente, pois ele opera dentro de nós, numa área que

nem mesmo nós conhecemos, mudando a inclinação do

nosso íntimo, fazendo-nos responder ao seu precioso e

incisivo chamado. Não podemos dizer como e nem quando o

Espírito Santo opera a regeneração em nós; razão porque não

podemos dizer o dia e a hora em que o novo nascimento

ocorreu. Identificamos essa obra em nós pelos frutos que

começamos a observar em nossa vida, mas não podemos

dizer com certeza quando aconteceu o milagre. Nossa

salvação, no seu todo, é monergística, isto é, Deus a realiza

sozinho, do começo ao fim. Tudo que sabemos é que o

homem natural em seus pecados não está disposto para Deus,

seu coração está fechado para a verdade e há trevas em sua

mente. Usando uma linguagem bem fácil para entendermos,

ele está para as coisas espirituais tanto quanto um urubu está

para alfaces ou couves – não lhe apetecem mesmo. Para tanto

precisaria ter sua natureza mudada. E é isto que Deus faz em

seus eleitos - “Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é;

as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo” - 2ª Coríntios

5.17. É Deus quem providencia para que seus escolhidos

ouçam a pregação do santo Evangelho enviando-lhes

pregadores; é ele também, que abre os ouvidos dos mesmos

de maneira que entendam a mensagem e a acolham em seus

corações - “Porque todo aquele que invocar o nome do SENHOR será

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salvo. Como, pois, invocarão aquele em quem não creram? E como

crerão naquele de quem não ouviram? E como ouvirão, se não há quem

pregue? E como pregarão, se não forem enviados?” - Romanos 10.13-

15. Há um exemplo de como Deus faz o coração do homem

natural inclinar-se a fazer algo espiritual, na vida de Ciro,

poderoso rei da Pérsia. Ciro não temia a Deus e nem mesmo

o conhecia, mas o Deus do céu tinha uma tarefa para ele:

libertar os judeus da Babilônia para que retornassem a

Jerusalém, a reconstruíssem, bem como ao templo. Assim está

escrito: “No primeiro ano de Ciro, rei da Pérsia ( para que se cumprisse

a palavra do SENHOR, pela boca de Jeremias ), despertou o SENHOR

o espírito de Ciro, rei da Pérsia, o qual fez passar pregão por todo o seu

reino, como também por escrito, dizendo: Assim diz Ciro, rei da Pérsia:

O SENHOR Deus dos céus me deu todos os reinos da terra, e me

encarregou de lhe edificar uma casa em Jerusalém, que está em Judá” -

Esdras 1.1-2. Deus despertou o espírito de Ciro para que

atendesse aos seus propósitos, e o rei acabou fazendo algo

que não estava em seus planos e que talvez nem ele mesmo

soubesse porque fez, mas fez, e o fez livremente. Assim Deus

realiza a conversão dos eleitos, soberanamente, contudo sem

violência, mas graciosamente. Só descobrimos que algo

aconteceu, quando ele já agiu e operou maravilhosamente em

nós. Então ficamos muito agradecidos por tão grande

salvação.

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Artigo 12 – A regeneração é obra de Deus somente

Essa conversão é aquela regeneração, nova criação,

ressurreição dos mortos e vivificação, tão exaltada na

Escritura, a qual Deus opera em nós independente de nós.

Essa regeneração, contudo, não se realiza de modo algum

pelo ensino exterior, pela persuasão moral, ou por um

suposto modo de operação que, após Deus ter feito a sua

parte, fica a critério do homem regenerar-se ou não,

converter-se ou não. É, portanto, claramente uma obra

sobrenatural, poderosíssima, e ao mesmo tempo a mais

deleitosa, maravilhosa, misteriosa e indizível. Segundo a

Escritura, inspirada pelo Autor dessa obra, a regeneração não

é inferior em poder à criação ou à ressurreição dos mortos.

Por isso, todos aqueles em cujo coração Deus opera desse

modo maravilhoso são, com certeza, infalível e eficazmente

regenerados e creem de fato. A vontade assim restaurada não

é apenas alvo da ação e da restauração de Deus, mas, sob o

agir de Deus, ela também age. Portanto, diz-se com justiça

que o homem crê e se arrepende mediante a graça que

recebeu.

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Comentário: Da forma que o Espírito Santo de Deus

age todos os eleitos são infalivelmente salvos, todavia não

contra a sua vontade; o Senhor age misteriosa e

soberanamente sem contudo violar a vontade do homem.

Quando o Espírito Santo opera dentro do eleito, ele passa a

querer Deus, acorda para a sua condição, sente sua

necessidade e precisão de Deus, reconhece sua miséria e

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indignidade, vê sua impotência e incapacidade e confia no

Mediador estabelecido por Deus – Cristo Jesus. Então é

despertado para uma nova vida, para coisas muito reais, mas

que para ele não existiam. Um cadáver caído à beira do

caminho nada vê, ouve ou sente do mundo ao seu redor.

Tudo ao seu redor é muito real: as campinas verdejantes e

floridas exalam seu perfume, os pássaros cantam à luz do sol

radiante entre as ramagens exuberantes. Tudo é muito sensível

para alguém que está vivo, mas para o cadáver, nada daquilo

existe. Ele não pode ver a luz ou as cores, nem ouvir os sons

ou os cantos, nem sentir os odor das flores ou a brisa. Então,

para ele, é como se nada daquilo existisse. Assim são as coisas

espirituais para aqueles que estão “mortos em ofensas e pecados” -

Efésios 2.1. Se Deus não o vivificar jamais o homem natural

poderá compreender tais mistérios maravilhosos - “As quais

também falamos, não com palavras de sabedoria humana, mas com as

que o Espírito Santo ensina, comparando as coisas espirituais com as

espirituais. Ora, o homem natural não compreende as coisas do Espírito

de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque

elas se discernem espiritualmente - 1ª Coríntios 2.13-14. Como disse

o Senhor Jesus ele “não pode ver o reino de Deus” - João 3.3. Veja

que não é o caso de algo que Deus realiza uma parte e então

deixa o restante com o homem. A salvação do eleito não é

algo que está a sua disposição, algo que ele pode tomar ou

largar, não; mas é uma obra completa - “E aos que predestinou a

estes também chamou; e aos que chamou a estes também justificou; e

aos que justificou a estes também glorificou” - Romanos 8.30. O

pecador eleito é salvo apesar dele próprio e não com a sua

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ajuda. É uma operação sobrenatural, irresistível, graciosa,

deleitosa; nós fomos atraídos para Cristo e nele incluídos para

sempre. O regenerado diz com toda propriedade: Deus me

amou e me salvou apesar de mim mesmo.

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Artigo 13 – A regeneração é incompreensível

Na vida presente, os crentes não podem compreender

completamente o modo como Deus realiza essa obra.

Contudo, é suficiente para os crentes conhecer e sentir que,

por essa graça de Deus, eles creem de coração e amam o seu

Salvador.

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Comentário: Todas as obras de Deus têm algo

misterioso – a criação, a regeneração, a ressurreição espiritual

e a física, tudo envolve mistério. Mistério, no sentido de que é

incompreensível para as criaturas, pois são coisas muito

gloriosas e profundas. Assim, a Igreja de Cristo é um mistério,

o crente é um mistério. Como criaturas caídas jamais

entenderemos plenamente o agir de Deus, por sinal isso é

uma das coisas que nos difere dele – o Senhor é o Deus

Criador e nós meramente suas criaturas. Como o Espírito de

Deus vem a nós e age em nós é totalmente misterioso - “O

vento assopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem,

nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascido do Espírito” -

João 3.8. Sabemos que está escrito: “Se com a tua boca confessares

ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dentre os

mortos, serás salvo” - Romanos 10.9. Mas se ele não despertar o

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nosso espírito e nos dar o dom da fé, jamais creremos.

Também está escrito: “Todo o que o Pai me dá virá a mim; e o que

vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora” - João 6.37. Mas ele

disse em seguida: “Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou

o não trouxer” - vs. 44. Não devemos ficar questionando as

obras de Deus, mas apenas adorá-lo. Tudo o que ele faz é

bom, é certo, pois ele é bom, perfeito, justo e misericordioso.

Jamais devemos cometer erro de investigar curiosamente as

ações do Senhor, mas nos prostrar a adorá-lo na beleza da sua

santidade. Quando compreendemos que ele nos amou e nos

salvou a despeito de nós, isto é, do que somos e do que

fazemos, só nos resta colocar nossa boca no pó, humilhados e

adorar esse Deus maravilhoso, cujo amor excede todo

entendimento. Amém.

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Artigo 14 – A fé é um dom de Deus

A fé, portanto, é um dom de Deus, não porque

meramente seja oferecida por Deus ao livre-arbítrio do

homem, mas porque é de fato conferida ao homem, e

implantada e infundida nele. Também não é um dom no

sentido de que Deus confere apenas a capacidade para crer, e

aguarda, do livre-arbítrio do homem, o consentimento para

crer ou o ato de crer. É, antes, um dom no sentido de que é

Deus quem efetua no homem tanto o querer quanto o

realizar, quem verdadeiramente faz tudo em todos, quem

realiza no homem tanto a vontade de crer quanto o ato de

crer.

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Comentário: Deus dá aos eleitos uma fé viva, ativa,

operante e predisposta a crer em Cristo, porque ela nos é dada

juntamente com a revelação de Cristo. Tão logo o eleito

conhece o Cristo do Evangelho, crê nele para sua salvação. A

fé dos eleitos nunca se inclina para o reino dos ídolos, das

superstições, nem repousa sobre boas obras ou justiça

pessoal. Ela é um dom de Deus aos herdeiros da salvação. Tal

fé os projeta diretamente para o Mediador, pois ele mesmo é

o Autor e consumador dessa fé - “Olhando para Jesus, autor e

consumador da fé, o qual, pelo gozo que lhe estava proposto, suportou a

cruz, desprezando a afronta, e assentou-se à destra do trono de Deus” -

Hebreus 12.2. Essa fé, que é um dom especial aos eleitos de

Deus, é gerada e operada pelo Espírito Santo. Por isso foi dito

que não é apenas uma capacidade que Deus dá ao pecador

para crer, se ele desejar; é muito mais do que isso. Esse dom,

necessariamente, propulsiona o homem a crer; ele crê

ininterruptamente pela ação do Espírito de Deus. O eleito

jamais perde essa fé, antes nela cresce e se fortalece, e conta

com a promessa de Deus de fazê-lo perseverar até o fim -

“Tendo por certo isto mesmo, que aquele que em vós começou a boa obra

a aperfeiçoará até ao dia de Jesus Cristo” - Filipenses 1.6.

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Artigo 15 – A atitude correta quanto à graça

imerecida de Deus

Deus não deve tal graça a ninguém. O que poderia Deus

dever ao homem? Quem primeiro lhe deu alguma coisa, para

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ser por ele ressarcido? O que poderia Deus dever a quem, em

si mesmo, nada tem senão pecado e falsidade? Portanto,

aquele que recebe essa graça é devedor e deve render

eternamente gratidão somente a Deus. Mas quem não recebe

essa graça não tem o menor interesse por essas coisas

espirituais e está satisfeito com o que possui, ou se vangloria

com a falsa segurança de ter o que não tem. Além disso,

quanto aos que professam externamente a sua fé e corrigem a

sua vida, devemos julgar e falar da forma mais favorável, de

acordo com o exemplo dos apóstolos, pois não conhecemos o

íntimo recôndito do coração; quanto aos que ainda não foram

chamados, devemos orar a Deus em favor deles, pois Deus é

quem chama à existência as coisas que não existem; quanto a

nós, não devemos jamais nos vangloriar, como se nós

fôssemos melhores do que eles.

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Comentário: O devedor é alguém que recebeu algo de

outrem. Em relação a Deus, claro está que os grandes

devedores somos sempre nós, os homens. Devemos tudo a

Deus, e ele não deve nada a nós, nem tem qualquer obrigação

para conosco - “Porque, quem te faz diferente? E que tens tu que não

tenhas recebido? E, se o recebeste, por que te glorias, como se não o

houveras recebido?” - 1ª Coríntios 4.7. Obviamente também que

Deus não nos propõe qualquer troca. Portanto nada há que

possamos fazer, para, em troca, obter uma bênção de Deus.

As coisas de Deus não têm preço e não estão à venda. A graça

é gratuita, ninguém a compra e ninguém a merece. Deus a dá

a quem quer, a quem escolhe - “Que diremos pois? que há injustiça

da parte de Deus? De maneira nenhuma. Pois diz a Moisés:

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Compadecer-me-ei de quem me compadecer, e terei misericórdia de quem

eu tiver misericórdia. Assim, pois, isto não depende do que quer, nem do

que corre, mas de Deus, que se compadece” - Romanos 9.14-16. Só

aprecia essa graça especial quem a recebe, mas quem não é

contemplado com ela, ignora-a e não tem por ela qualquer

interesse ou apreço. Diferentemente, aqueles que a receberam

querem que todos dela participem e oram fervorosamente por

aqueles que ainda estão longe desse recôndito, para que Deus

se compadeça deles e os faça chegar a si.

--------------------------------------------------------------------------

Artigo 16 – A vontade do homem não é eliminada,

mas vivificada

Apesar de sua queda, o homem não deixou de ser

homem, dotado de inteligência e vontade; e o pecado, que

impregnou toda a raça humana, não privou o homem da sua

natureza humana, mas trouxe sobre ele a depravação e a

morte espiritual. Assim também, a graça divina da

regeneração não atua sobre os homens como se fossem

máquinas ou robôs, e não elimina a vontade e as suas

propriedades nem a coage violentamente, mas torna-a

espiritualmente viva, sara-a, corrige-a e, de modo agradável e

ao mesmo tempo poderoso, a subjuga. O resultado é que

onde antes dominava totalmente a rebelião e a resistência da

carne, agora, pelo Espírito, começa a prevalecer uma pronta e

sincera obediência, que é a verdadeira renovação e libertação

espiritual da nossa vontade. Mas, se o Maravilhoso Autor de

todo o bem não tivesse nos conduzido dessa maneira, o

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homem não teria a menor esperança de erguer-se da sua

queda mediante o seu livre-arbítrio, o qual, quando ele ainda

estava em pé, o lançou na perdição.

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Comentário: Há uma grande e misteriosa diferença

entre a queda dos anjos e a dos homens. A queda dos anjos

foi total e completa, irreversível e definitiva. De criaturas

maravilhosas que eram tornaram-se horríveis demônios. Tais

criaturas se tornaram tão malévolas quanto poderiam se

tornar, ou seja, essencialmente más. Para elas não há resgate,

mas já se encontram na condenação eterna. Os homens

caíram, mas sua queda foi muito diferente. Mesmo caídos,

continuam humanos e vivem num mundo caído, porém,

assistido pela graça geral de Deus. Assim, os homens naturais,

ainda que totalmente depravados, rebeldes, perdidos e em

trevas, não se tornaram tão malignos quanto poderiam se

tornar. Em geral há ainda, digamos, fragmentos da imagem de

Deus neles. O pior bandido e malfeitor ainda pode se

arrepender, sentir empatia, apresentar traços de bondade,

mesmo que muito tênues, mas estão lá. Então quando o

Espírito de Deus vem sobre um eleito e a graça soberana nele

opera, não acontece algo automático, onde a sua vontade não

participa. Ao contrário, a graça de Deus age libertando sua

vontade, dissipando as trevas da sua mente, revelando as

maravilhas de Cristo - “E até hoje, quando é lido Moisés, o véu está

posto sobre o coração deles. Mas, quando se converterem ao Senhor,

então o véu se tirará” - 2ª Coríntios 3.15-16. De modo que a obra

da conversão, ainda que em alguns casos, seja dramática,

contudo é doce e suave como só o Senhor pode e sabe fazer.

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Os Cânones de Dort

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Contudo, se não fora o novo sopro do Espírito de Deus,

fazendo uma nova criação, jamais aquele homem poderia

desvencilhar-se da escravidão do pecado e se voltar para Deus

por sua própria iniciativa. Graças, porém a Deus que não nos

entregou a nós mesmos, nem nos abandonou em nossos

pecados! “Graças a Deus pelo seu dom inefável!” - 2ª Coríntios 9.15.

--------------------------------------------------------------------------

Artigo 17 – O uso dos meios

A onipotente obra de Deus, pela qual ele produz e

sustenta a nossa vida natural, não exclui, mas exige, o uso dos

meios através dos quais ele quis exercer o seu poder, segundo

a sua infinita sabedoria e bondade. Assim também, a

mencionada obra sobrenatural de Deus, mediante a qual ele

nos regenera, não exclui nem cancela, de jeito nenhum, o uso

do evangelho que o sapientíssimo Deus ordenou para ser a

semente da regeneração e o alimento da alma. Por essa razão,

os apóstolos e os mestres que os sucederam ensinaram

reverentemente ao povo sobre a graça de Deus, para a glória

dele e para a vergonha de toda a soberba. Ao mesmo tempo,

não negligenciaram mantê-los por meio das santas

admoestações do evangelho, debaixo da administração da

Palavra, dos sacramentos e da disciplina. Portanto, os que hoje

instruem ou são instruídos na Igreja não devem ousar tentar a

Deus, separando aquilo que ele pelo seu beneplácito quis unir

de forma inseparável. Pois a graça é concedida mediante

admoestações, e quanto mais prontamente cumprirmos com

o nosso dever, tanto mais esse favor de Deus, que é quem

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Os Cânones de Dort

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opera em nós, manifesta-se naturalmente em sua glória,

fazendo a sua obra prosperar da melhor maneira.

A Deus somente seja dada a glória eternamente, tanto

pelos meios quanto pelos frutos e eficácia da sua salvação.

Amém.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: A Providência de Deus muito se utiliza

dos meios que o próprio Deus decretou para produzir os fins,

também pelo eterno conselho, decretados. Deus se vale tanto

de meios materiais e naturais quanto de meios espirituais e

sobrenaturais para atingir seus objetivos. É Deus quem nos dá

o pão cotidiano, mas ele não o faz cair do céu como poderia

se o desejasse – antes ele orienta o agricultor a plantar a

semente que será regada com a chuva do céu e frutificará, de

onde virá o grão que será moído para com a farinha fazer-se o

pão. Contudo, é ele quem governa e abençoa todo o processo.

Quanto a nossa vida espiritual também proveu meios para a

sua manutenção. Ele deu à sua Igreja os meios da graça,

através dos quais os crentes são alimentados, fortalecidos e

firmados na vida espiritual, na sã doutrina e na obediência.

Nunca devemos viver ociosos, passivos supondo que uma vez

que Deus tudo decretou, tudo acontecerá independente de

nós; tal pensamento é equivocado. Fato é, que, uma vez

justificados seremos glorificados, porém, entre a justificação e

a glorificação está a santificação, o crescimento na graça e no

conhecimento do Senhor; e tudo isto acontece pelos meios da

graça que ele estabeleceu: comunhão, oração, leitura da

Palavra, a pregação, os sacramentos, a disciplina, e outros.

Portanto, devemos ser ativos no Reino de Deus, diligentes no

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Os Cânones de Dort

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seu serviço, disciplinados, submissos e preparados para toda a

boa obra. Homens, mulheres, jovens e crianças devem, diária

e sistematicamente, colher do maná com o qual Deus

alimenta as nossas almas famintas.

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A perseverança dos santos

Capítulos 5

Artigo 1 – Os regenerados não estão livres do

pecado interior

Aqueles que, de acordo com o seu propósito, Deus

chama à comunhão do seu Filho, nosso Senhor Jesus Cristo, e

regenera pelo Espírito Santo, ele certamente os livra do

domínio e da escravidão do pecado. Mas, nesta vida, ele não

os livra totalmente da carne e do corpo o pecado.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: A regeneração livrou o nosso espírito do

pecado, ficando este apenas em nosso corpo. Nosso corpo,

sim, ainda é, como que, viciado ou habituado a pecar, por isso

é preciso vigilância e disciplina constantes - “Antes subjugo o

meu corpo, e o reduzo à servidão, para que, pregando aos outros, eu

mesmo não venha de alguma maneira a ficar reprovado” - 1ª Coríntios

9.27. Mesmo depois da regeneração Deus ainda nos deixa

vivendo no velho tabernáculo terreno, isto é, no antigo corpo.

“Porque sabemos que, se a nossa casa terrestre deste tabernáculo se

desfizer, temos de Deus um edifício, uma casa não feita por mãos,

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Os Cânones de Dort

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eterna, nos céus” - 2ª Coríntios 5.1, mas por enquanto, devemos

ficar nesse corpo até que ele volte ao pó de onde foi tirado.

Um dos propósitos de Deus em nos redimir por partes é nos

provar para ver se realmente o amamos e o obedeceremos.

Exatamente como ele fez com Israel – deixou ficar alguns

inimigos entre eles para que fossem provados - “Tampouco

desapossarei mais de diante deles a nenhuma das nações, que Josué

deixou, quando morreu; Para por elas provar a Israel, se há de guardar,

ou não, o caminho do SENHOR, como seus pais o guardaram, para

nele andar. Assim o SENHOR deixou ficar aquelas nações, e não as

desterrou logo, nem as entregou na mão de Josué” - Juízes 2.21-23.

Quando um crente em Cristo Jesus morre e seu espírito sai do

seu corpo, então estará livre do pecado para sempre. Passará a

aguardar a segunda parte da redenção que é o novo corpo - “E

não só ela, mas nós mesmos, que temos as primícias do Espírito,

também gememos em nós mesmos, esperando a adoção, a saber, a

redenção do nosso corpo” - Romanos 8.23. Já uma pessoa que

morre no pecado, isto é, sem ser redimida e regenerada,

quando sair desse corpo, o pecado, que está em seu espírito

continuará para sempre amalgamado a ele. Na ressurreição do

último dia, seu corpo sairá da sepultura, será unido de novo à

sua alma e ambos serão condenados ao inferno eterno. O

ímpio será punido no inferno justamente porque o seu

pecado continua nele e com ele, inseparavelmente,

eternamente. O crente porém, na ressurreição do último dia,

ganhará um novo corpo, sobre o qual o pecado não mais terá

poder, pois será um corpo glorioso que não mais conhecerá o

pecado e a corrupção - “Que transformará o nosso corpo abatido,

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Os Cânones de Dort

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para ser conforme o seu corpo glorioso, segundo o seu eficaz poder de

sujeitar também a si todas as coisas” - Filipenses 3.21. Nessa nova

realidade não haverá mais a opção para pecarmos. O pecado e

a queda serão uma lembrança da condição que estávamos e

fomos libertos pelo sangue do Cordeiro, para que ele receba a

glória eternamente. Amém.

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Artigo 2 – Os pecados diários por causa da fraqueza

humana

Por causa da fraqueza humana, os santos pecam

diariamente a até mesmo suas melhores obras são imperfeitas.

Para eles, essas coisas são motivos permanentes para se

humilharem diante de Deus, para se refugiarem no Cristo

crucificado, para mortificarem cada vez mais a carne mediante

o Espírito de oração e através de santos exercícios de piedade,

e para ansiarem e se esforçarem pelo alvo da perfeição, até

que, finalmente, livres deste corpo de morte, reinem com o

Cordeiro de Deus no céu.

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Comentário: Conforme já vimos, o fato do sábio Deus

nos deixar habitando no mesmo corpo caído até que a

redenção se complete no último dia, também deixando um

resquício do veneno do pecado em nós é porque isso é bom e

necessário para nós. Isso nos humilha, faz-nos dependentes,

leva-nos a orar constantemente; impede-nos de buscar a

autonomia no pecado, o que nos levaria à destruição. Ainda

deixa claro que jamais um pecador pode ser justificado pelas

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Os Cânones de Dort

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obras, simplesmente porque ele não tem boas obras, mas

apenas obras contaminadas. Quando somos picados por uma

abelha ela injeta seu veneno e deixa junto o seu ferrão.

Mesmo que rapidamente retiremos o ferrão, o veneno

continua agindo em nosso sistema. Assim também Cristo

quebrou o aguilhão do pecado em nossas vidas, mas o veneno

que já circulava em nossas veias continua agindo. Por isso

temos que combater os efeitos desse veneno durante toda a

nossa vida. Essa luta do crente contra o pecado faz com que

ele aborreça a sua vida presente e não se apegue a nada deste

mundo caído, antes deseje a glória do céu - “Quem ama a sua

vida perdê-la-á, e quem neste mundo odeia a sua vida, guarda-la-á

para a vida eterna” - João 12.25. O autêntico crente vive

diariamente mortificando sua carne, não cedendo terreno aos

inimigos da sua alma - “Mortificai, pois, os vossos membros, que

estão sobre a terra: a prostituição, a impureza, a afeição desordenada, a

vil concupiscência, e a avareza, que é idolatria; Pelas quais coisas vem a

ira de Deus sobre os filhos da desobediência; Nas quais, também, em

outro tempo andastes, quando vivíeis nelas. Mas agora, despojai-vos

também de tudo: da ira, da cólera, da malícia, da maledicência, das

palavras torpes da vossa boca. Não mintais uns aos outros, pois que já

vos despistes do velho homem com os seus feitos, E vos vestistes do novo,

que se renova para o conhecimento, segundo a imagem daquele que o

criou” - Colossenses 3.5-10. Por isso também o crente não teme a

morte, antes a vê como uma libertação do corpo do pecado,

como o apóstolo Paulo bem disse: “Porque para mim o viver é

Cristo, e o morrer é ganho. Mas, se o viver na carne me der fruto da

minha obra, não sei então o que deva escolher. Mas de ambos os lados

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estou em aperto, tendo desejo de partir, e estar com Cristo, porque isto é

ainda muito melhor” - Filipenses 1.21-23.

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Artigo 3 – Deus preserva os que são seus

Por causa desses resquícios do pecado que ainda restam

no íntimo, e também por causa das tentações do mundo e de

Satanás, os convertidos não conseguiriam perseverar nessa

graça, caso fossem entregues às suas próprias forças. Mas que,

Deus é fiel e os confirma misericordiosamente na graça que,

de uma vez por todas, lhes foi outorgada, e os preserva

poderosamente nela até o fim.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: O crente em Jesus Cristo não é mais servo

do pecado e sim servo de Deus; contudo, apesar de haver sido

liberto do poder e escravidão do pecado e ser totalmente livre

em seu espírito, permanece no corpo de carne, que está

habituado ao estilo de vida caído e pecaminoso, e por isso é

muito difícil de ser subjugado. Só pela graça de Deus para

vivermos desembaraçados do pecado neste mundo caído,

com um corpo que se ajusta tão bem a ele. Mas essa tem sido

a experiência de todos os servos de Deus de todos os tempos.

Até o santo apóstolo Paulo disse: “Porque eu sei que em mim, isto

é, na minha carne, não habita bem algum; e com efeito o querer está em

mim, mas não consigo realizar o bem. Porque não faço o bem que

quero, mas o mal que não quero esse faço. Ora, se eu faço o que não

quero, já o não faço eu, mas o pecado que habita em mim” - Romanos

7.18-20. Nossa confiança é que Aquele que nos chamou e

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justificou agora está nos santificando pelo seu Espírito Santo

que em nós habita, e fará isto até a nossa glorificação. Cremos

e descansamos em sua fiel promessa: “E aos que predestinou a

estes também chamou; e aos que chamou a estes também justificou; e

aos que justificou a estes também glorificou” - Romanos 8.30. O

Senhor Jesus é o nosso Sumo Pastor e nenhuma só das suas

ovelhas poderá se perder - “As minhas ovelhas ouvem a minha voz,

e eu conheço-as, e elas me seguem; e dou-lhes a vida eterna, e nunca

hão de perecer, e ninguém as arrebatará das minhas mãos. Meu Pai,

que mas deu, é maior do que todos; e ninguém pode arrebatá-las das

mãos de meu Pai. Eu e o Pai somos um” - João 10.27-30.

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Artigo 4 – Os santos estão sujeitos a cair em

pecados graves

Embora o poder de Deus, pelo qual ele confirma e

preserva os verdadeiros crentes na graça, seja tão grande que

não pode ser vencido pela carne, os convertidos, contudo,

nem sempre são guiados e dirigidos por Deus, de sorte que

não possam, em certas circunstâncias particulares e pela

própria culpa deles, se desviar da direção da graça e serem

seduzidos pala carne e se rendam à sua concupiscência. Por

isso, eles devem orar e vigiar constantemente para que não

caiam em tentação. Quando não vigiam nem oram, eles não

somente podem ser levados – pela carne, pelo mundo e por

Satanás – a cometer sérios e atrozes pecados, mas, algumas

vezes, podem ser levados a isso pela justa permissão de Deus.

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É o que demonstram as lamentáveis quedas de Davi, de Pedro

e de outros santos, descritas na Escritura.

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Comentário: A mesma graça soberana que nos

convence, inclina os nossos corações, nos convertendo a

Deus, também nos faz perseverar e permanecer firmes e fiéis

até ao fim. Contudo, na nossa jornada cristã, estamos sujeitos

a pecar e fatalmente pecaremos muitas vezes, e alguns até

poderão mesmo cair em graves pecados; por isso que somos

exortados a orar e vigiar sem cessar. Deus, porém, tem um

bom propósito em todas as coisas, até mesmo em permitir

que sejamos vencidos pelo pecado algumas vezes. Nada

humilha tanto o soldado fiel quanto cair diante de um

inimigo, mas às vezes isso se faz necessário para que ele

reconheça suas limitações e não subestime o inimigo. Somos

advertidos, muitas vezes, que nossa luta é ferrenha e contra

inimigos poderosíssimos, e que só estamos em pé pela graça

do nosso bom Senhor e Comandante. Por isso o crente deve

prestar muita atenção às advertências: “Vigiai e orai, para que não

entreis em tentação; na verdade, o espírito está pronto, mas a carne é

fraca” - Mateus 26.41; “Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe não

caia” - 1ª Coríntios 10.12; “Porque não temos que lutar contra a carne e

o sangue, mas, sim, contra os principados, contra as potestades, contra

os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da

maldade, nos lugares celestiais” - Efésios 6.12. Entretanto o nosso

alvo deve ser uma vida completamente vitoriosa sobre o

pecado e devemos que orar, vigiar e nos esforçar para tanto.

Essa é a nossa obrigação e essa também é a vontade de Deus

para nós. Contudo, se eventualmente cairmos, não devemos

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ficar prostrados, mas confessar nossos pecados e fraquezas e

prosseguirmos confiantes de que a batalha, em última

instância não é nossa, mas do Senhor e, portanto, já está

ganha. Todos os inimigos contra os quais lutamos já foram

derrotados pelo nosso General. Uma das suas últimas

palavras foram: “Tenho-vos dito isto, para que em mim tenhais paz; no

mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o mundo - João

16.33.

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Artigo 5 – As consequências desses graves pecados

Os crentes, no entanto, por causa desses graves pecados,

ofendem profundamente a Deus, tornam-se culpados de

morte, entristecem o Espírito Santo, suspendem o exercício

da fé, ferem gravemente a própria consciência e, algumas

vezes, perdem o senso do favor de Deus, até que voltem ao

reto caminho por meio do arrependimento sincero, e o rosto

paternal de Deus resplandeça novamente sobre eles.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: É por demais encorajador, ver nas

Escrituras que mesmo na sua justa e santa ira, Deus trata os

seus filhos com misericórdia, pois esses são objeto de seu

amor eterno – são seus filhos. Ainda que Deus se ire conosco

por causa dos nossos pecados, ele irá nos corrigir como Pai

amoroso que é, para o nosso bem. Sim, somos corrigidos para

nossa boa saúde espiritual. Deus se vinga dos inimigos, mas

nunca dos filhos. Veja o exemplo de Davi, quando, após seu

pecado, Deus o tratou duramente, mas a punição tinha o

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objetivo de restaurá-lo - “Quando eu guardei silêncio, envelheceram

os meus ossos pelo meu bramido em todo o dia. Porque de dia e de noite

a tua mão pesava sobre mim; o meu humor se tornou em sequidão de

estio. Confessei-te o meu pecado, e a minha maldade não encobri. Dizia

eu: Confessarei ao SENHOR as minhas transgressões; e tu perdoaste a

maldade do meu pecado” - Salmo 32.3-5. Está escrito: “Porque o

Senhor corrige o que ama, E açoita a qualquer que recebe por filho. Se

suportais a correção, Deus vos trata como filhos; porque, que filho há a

quem o pai não corrija?” - Hebreus 12.6. Tudo o que Deus nos faz

é visando o nosso bem maior, que é nos transformar e

conformar a Jesus Cristo. Tudo que os ímpios sofrem neste

mundo, de nada lhes aproveita, mas o que os santos sofrem

traz-lhes grande proveito; fá-los participantes da santidade de

Deus - “Porque aqueles [nossos pais], na verdade, por um pouco de

tempo, nos corrigiam como bem lhes parecia; mas este [Deus], para

nosso proveito, para sermos participantes da sua santidade” - Hebreus

12.10. Da mesma forma que os ímpios são vasos de ira e

objeto da ira eterna, outro tanto os pios são vasos de

misericórdia e objeto do amor eterno. Portanto, mesmo nos

momentos em que os homens piedosos caem em pecado,

ofendem a Deus e provocam a sua ira, recebem apenas uma

punição temporária para a sua correção - “Porque a sua ira dura

só um momento; no seu favor está a vida; o choro pode durar uma

noite, mas a alegria vem pela manhã” – Salmo 30.5.

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Artigo 6 – Deus não permitirá que os seus eleitos se

percam

Deus, que é rico em misericórdia, segundo o seu

propósito imutável da eleição, não retira completamente o seu

Espírito Santo dos que lhes pertencem, mesmo diante de suas

deploráveis quedas. Tampouco permite que se afundem tanto

a ponto de caírem da graça da adoção e do estado de

justificação, ou que cometam o pecado para a morte – isto é,

o pecado contra o Espírito Santo – e que, totalmente

abandonados por ele, se lancem na ruína eterna.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: O regenerado, pode, eventualmente, cair

em algum pecado, mas jamais cometerá o pecado que leva à

morte espiritual ou eterna. Todo eleito já foi curado

eternamente pela expiação do Senhor Jesus Cristo. Ele está

totalmente seguro nas mãos do Pai e no seu amor. É assistido

pela graça soberana de Deus que o impede de voltar ao seu

antigo estado de degradação e morte espiritual. Assim, ainda

que caia em algum tipo de pecado, por grave que seja, todavia

jamais cai no mesmo lugar que costumava cair antigamente;

assim, ainda que venha a cair drasticamente, todavia não ficará

caído - “Ainda que caia, não ficará prostrado, pois o SENHOR o

sustém com a sua mão” - Salmo 37.24. Um dos medos do crente

autêntico é ofender a Cristo, pecar contra o Espírito Santo, e

esse medo até certo ponto pode ser saudável, mas é

maravilhoso saber que jamais um autêntico filho de Deus

pode cometer a blasfêmia contra o Espírito Santo, uma vez

que esse pecado é imperdoável - “Portanto, eu vos digo: Todo o

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pecado e blasfêmia se perdoará aos homens; mas a blasfêmia contra o

Espírito não será perdoada aos homens. E, se qualquer disser alguma

palavra contra o Filho do homem, ser-lhe-á perdoado; mas, se alguém

falar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado, nem neste século

nem no futuro” - Mateus 12.31-32. Todo crente genuíno está tão

seguro nas mãos do Senhor quanto Noé e seus filhos estavam

dentro da arca. Durante todo o Dilúvio os olhos de Deus

estiveram vigiando a arca onde estavam Noé e sua família para

que nada de mal lhes acontecesse. Sobreviveram à maior

catástrofe natural da humanidade, intactos. Abalos sísmicos,

placas tectônicas se abrindo, fontes do grande abismo se

rompendo, continentes e ilhas se movendo. Não sobrou nada

com vida sobre a terra. Quanto a Noé e sua família?

Pousaram no monte Ararate, sem um arranhão. Deus protege

e ampara os seus graciosamente. Amém.

--------------------------------------------------------------------------

Artigo 7 – Deus renova os seus eleitos para o

arrependimento

Durante a queda dos eleitos, Deus, primeiramente,

preserva neles a semente imperecível de regeneração par que

ela não morra e seja lançada fora. Além disso, através da sua

Palavra e do seu Espírito, ele certa e eficazmente os renova

para o arrependimento. Como resultado disso, eles sentem o

coração contristado com verdadeira tristeza espiritual pelos

pecados que cometeram; e, com o coração contrito, buscam e

obtêm pela fé o perdão no sangue do Mediador,

experimentam novamente o favor de um Deus reconciliado, e

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adoram as suas misericórdias e fidelidade; daí em diante,

passam a desenvolver mais diligentemente a própria salvação

com temor e tremor.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: O crente autêntico tem um conservante

natural, ou melhor, sobrenatural, que é a vida de Deus nele

implantada; essa vida vinda do Espírito Santo o preserva em

meio à corrupção e depravação do mundo caído - “Qualquer

que é nascido de Deus não comete pecado; porque a sua semente

permanece nele; e não pode pecar, porque é nascido de Deus... Sabemos

que todo aquele que é nascido de Deus não peca; mas o que de Deus é

gerado conserva-se a si mesmo, e o maligno não lhe toca” - 1ª João 3.9;

5.18. O bom e sábio propósito de Deus, converterá, até

mesmo os nossos erros e fracassos em bem espiritual, ainda

que tenhamos que sofrer certas consequências físicas,

materiais e temporais. O santo pode vir a pecar mas, o

Espírito Santo não o deixa no pecado e nem se retira dele,

antes o leva ao arrependimento, pois o regenerado não tem

mais prazer no pecado. A diferença entre o pio e o ímpio, é

que o pio está com Deus e contra o pecado, já o ímpio está

com o pecado e contra Deus. Ainda que o santo de Deus

peque, ele se detesta e se abomina quando o faz.

Imediatamente busca o perdão de Deus e a purificação no

sangue de Cristo, e depois disto fica ainda mais vigilante em

relação ao pecado e mais sensível em relação a Deus.

Diferentemente, o ímpio não se importa quando peca, nem

sente culpa por ofender a Deus, nem mesmo percebe quando

o faz. São João escreveu aos crentes: “Se confessarmos os nossos

pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de

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toda injustiça…. Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo para que não

pequeis; e, se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus

Cristo, o Justo. E ele é a propiciação pelos nossos pecados e não somente

pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo” - 1a

 João 1.9 e 2.1-2.

--------------------------------------------------------------------------

Artigo 8 – A graça do Trino Deus preserva

Não é pelos seus próprios méritos ou força, mas pela

imerecida misericórdia de Deus, que os eleitos não se desviam

totalmente da fé e da graça nem permanecem caídos a ponto

de finalmente se perderem. Quanto a eles, isso facilmente

poderia acontecer, e aconteceria sem dúvida. Mas quanto a

Deus, não há a menor possibilidade de que isso aconteça, pois

o seu conselho não pode ser mudado; a sua promessa não

pode falhar; o chamado segundo o seu propósito não pode

ser revogado; o mérito, a intercessão e a proteção de Cristo

não podem ser anulados; e o selo do Espírito Santo não pode

ser frustrado nem destruído.

--------------------------------------------------------------------------

Comentário: Se a salvação dependesse em algum

aspecto, em alguma instância ou em alguma medida de nós,

certamente seríamos todos condenados ao inferno, porque

não temos nada que possa ajudar, favorecer ou contribuir

nesse sentido, antes, tudo que fosse deixado a nós, seria

frustrado. Mas Deus não deixou nada para nós fazermos, ele

fez tudo sozinho. Por isso o apóstolo falou tão firmemente:

“Porque os que dantes conheceu também os predestinou para serem

conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito

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entre muitos irmãos. E aos que predestinou a estes também chamou; e

aos que chamou a estes também justificou; e aos que justificou a estes

também glorificou” - Romanos 8.29-30. Quando cremos em

Cristo, ele nos dá seu Espírito Santo como penhor ou garantia

de que a obra será completada - “Em quem também vós estais,

depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa

salvação; e, tendo nele também crido, fostes selados com o Espírito Santo

da promessa. O qual é o penhor da nossa herança, para redenção da

possessão adquirida, para louvor da sua glória” - Efésios 1.13-14. De

fato o selo do Espírito Santo em nossas vidas significa: 1)

propriedade – temos um Dono e Senhor que cuida de nós e

ninguém nos tirará de Sua mão; 2) autenticidade – quem tem

o selo do Espírito é um autêntico filho de Deus; 3) segurança

– selo também indica segurança ou inviolabilidade. Estamos

lacrados e hermeticamente fechados por Deus; 4) garantia –

um selo significa garantia de que algo chegará ao seu destino

final. Os dons de Deus são irrevogáveis e, portanto,

imperdíveis. É absolutamente impossível um eleito de Deus

perder-se definitivamente estando a caminho do céu. Tal

pensamento seria um insulto ao Senhor - “O conselho do

SENHOR permanece para sempre; os intentos do seu coração de

geração em geração” - Salmo 33.11. Então, ainda que o crente caia

e perca toda esperança de retornar à sua antiga condição,

Deus agirá nele e o fará voltar ainda mais forte e encorajado.

Obviamente que isso não significa que ele tem um tipo de

foro privilegiado para que possa ficar despreocupado em

relação ao pecado. Muito pelo contrário, o pecado deve ser

odiado, temido, evitado e combatido com toda a nossa alma.

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Os Cânones de Dort

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Artigo 9 – A certeza dessa preservação

Os próprios crentes podem ter a plena certeza da

preservação do eleito para a salvação e da perseverança dos

verdadeiros crentes na fé. E, de fato, cada um deles está

convencido disso, segundo a medida da sua fé, pela qual

creem firmemente que são e que permanecerão membros

verdadeiros e vivos da igreja, e que possuem o perdão dos

pecados e a vida eterna.

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Comentário: Como já falamos anteriormente, o eleito é

chamado, justificado, santificado, conservado, preservado e

glorificado. Nada pode quebrar a linda cadeia dourada, isso já

foi dito e repetido muitas vezes, porque foi o próprio Senhor

Jesus quem deu aos seus cordeiros essa segurança. Em sua

oração intercessória disse mais: “Pai, aqueles que me deste quero

que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que vejam a

minha glória que me deste; porque tu me amaste antes da fundação do

mundo” - João 17.24. Se nem todos os crentes têm plena

convicção da sua salvação, talvez seja por imaturidade ou falta

de conhecimento da Palavra de Deus. Contudo, o fato

inquestionável é, que todas as ovelhas do Senhor serão

arrebanhadas e trazidas ao aprisco pelo Sumo Pastor e por ele

mantidas até o fim desta era e para sempre. Não poderia ser

de outra forma, pois nada temos que não tenhamos recebido -

“E que tens tu que não tenhas recebido?” - 1ª Coríntios 4.7. Seja para

nossa vida material ou para nossa vida espiritual, toda a

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Os Cânones de Dort

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manutenção vem do céu - “O homem não pode receber coisa

alguma, se não lhe for dada do céu” - João 3.27. Jesus fez

promessas tão específicas que não há como não compreender

o que estava dizendo. Ele disse que tornaria a salvação de suas

ovelhinhas tão seguras quanto ele pode fazê-lo - “E dou-lhes a

vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebatará da minha

mão. Meu Pai, que mas deu, é maior do que todos; e ninguém pode

arrebatá-las da mão de meu Pai” - João 10.28-29. Cabe a nós

confiar nessas promessas e nelas descansar porque ele é fiel e

poderoso para cumpri-las, e bom para conosco. Então, não

devemos temer mal algum, antes confessar o que o apóstolo

confessou: “Eu sei em quem tenho crido, e estou certo de que é

poderoso para guardar o meu depósito até àquele dia” - 2ª Timóteo

1.12. Amém.

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Artigo 10 – A fonte dessa certeza

Tal certeza não é produzida por alguma revelação

particular, além ou fora da Palavra, mas pela fé nas promessas

de Deus, que ele revelou abundantemente em sua Palavra para

o nosso consolo; pelo testemunho do Espírito Santo, que

testifica com o nosso espírito que somos filhos e herdeiros de

Deus; e, finalmente, pela busca zelosa e santa de uma

consciência limpa e de boas obras. Se, neste mundo, os eleitos

de Deus não tivessem o inabalável consolo da obtenção da

vitória e da garantia infalível da glória eterna, eles seriam os

mais miseráveis de todos os homens.

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Comentário: A certeza da perseverança na salvação, é

uma bênção que os peregrinos desfrutam, enquanto

atravessam o deserto deste mundo, lutando contra os seus

inimigos, sob o sol causticante, expostos a todos os perigos e

totalmente vulneráveis. É nesse contexto que a certeza de que

o Senhor está conosco e que chegaremos do outro lado, faz

toda a diferença. Essa certeza vem junto com uma confiança

viva nas promessas da Aliança, um testemunho e convicção

interior do Espírito Santo e um desejo de agradar ao Senhor,

tanto por boas obras quanto mantendo uma consciência

limpa e tranquila diante de Deus e dos homens. E, Deus

mesmo cria e usa todas essas coisas para mostrar a nós que

podemos descansar em sua Providência; porque ele não

apenas começou algo para deixar conosco o dar continuidade,

mas mantém tudo que criou pelo seu poder e levará toda a

criação ao destino final -, por ele decretado -, para a sua

própria glória e louvor. Saber que não estamos sozinhos em

nossa jornada também é muito consolador, bem como ter

conhecimento de que muitos outros cruzaram esse deserto

antes de nós, e o fizeram vitoriosamente - “Pela fé Moisés, sendo

já grande, recusou ser chamado filho da filha de Faraó, Escolhendo

antes ser maltratado com o povo de Deus, do que por um pouco de

tempo ter o gozo do pecado; Tendo por maiores riquezas o vitupério de

Cristo do que os tesouros do Egito; porque tinha em vista a recompensa.

Pela fé deixou o Egito, não temendo a ira do rei; porque ficou firme,

como vendo o invisível... As mulheres receberam pela ressurreição os

seus mortos; uns foram torturados, não aceitando o seu livramento, para

alcançarem uma melhor ressurreição; E outros experimentaram

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escárnios e açoites, e até cadeias e prisões. Foram apedrejados, serrados,

tentados, mortos ao fio da espada; andaram vestidos de peles de ovelhas

e de cabras, desamparados, aflitos e maltratados ( Dos quais o mundo

não era digno ), errantes pelos desertos, e montes, e pelas covas e

cavernas da terra” - Hebreus 11.24-27, 35-38. Todos esses santos já

chegaram do outro lado e hoje gozam da recompensa de sua

fidelidade e confiança em seu Guia e Protetor.

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Artigo 11 – Essa certeza nem sempre é sentida

A Escritura, no entanto, testifica que nesta vida os

crentes têm de lutar contra várias dúvidas da carne e, por

estarem sujeitos a fortes tentações, nem sempre sentem essa

plena segurança da fé nem a certeza da perseverança. Mas

Deus, que é o Pai de toda consolação, não permitirá que

sejam tentados além das suas forças, mas com a tentação

proverá também o meio de escape e, pelo Espírito Santo, fará

ressurgir a certeza da perseverança.

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Comentário: Tudo o que Deus em sua maravilhosa

providência faz, é perfeito e tem sábios, justos e santos

propósitos. Logo, se ele não removeu totalmente a toxina do

pecado nas vidas dos regenerados, é porque tem nisso um

propósito bom. Isso os fará compreender a dependência dele

e os levará a buscar sua face continuamente. Enquanto

estivermos nesse mundo caído e nesse corpo de carne,

estaremos sujeitos a muitas tentações, muitas fraquezas e

pecados. Dúvidas nos assaltam, tentações nos sobrevêm,

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questionamentos nos perturbam, instabilidades nos

desencorajam, depressões nos abatem; mas temos a promessa:

“Não veio sobre vós tentação, senão humana; mas fiel é Deus, que não

vos deixará tentar acima do que podeis, antes com a tentação dará

também o escape, para que a possais suportar” - 1ª Coríntios 10.13.

Essa luta contínua, é para que não nos esqueçamos que ainda

não chegamos ao porto seguro, do outro lado. Agora, é

preciso lembrar que o grande Comandante, não apenas nos

enviou para a batalha, mas está conosco a par e passo, dia a

dia, minuto a minuto; ele disse: “Não te deixarei, nem te

desampararei” - Hebreus 13.5. Ele mesmo nos protegerá dos

inimigos internos e externos, não permitindo que sejamos

desencorajados e nem destruídos - “Porque ele te livrará do laço

do passarinheiro, e da peste perniciosa. Ele te cobrirá com as suas penas,

e debaixo das suas asas te confiarás; a sua verdade será o teu escudo e

broquel. Não terás medo do terror de noite nem da seta que voa de dia,

Nem da peste que anda na escuridão, nem da mortandade que assola

ao meio-dia. Mil cairão ao teu lado, e dez mil à tua direita, mas não

chegará a ti” - Salmo 91.3-7. Confiando em suas promessas e

descansando em seu amor teremos a firme certeza de que as

negras nuvens passarão e novamente veremos o brilho da sua

glória; assim, prosseguiremos nossa marcha até cruzar o limite

do tempo e adentrarmos a eternidade.

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Artigo 12 – Essa certeza é um estímulo à piedade

Essa certeza de perseverança, longe de tornar os

verdadeiros crentes, orgulhosos e acomodados, é antes a

verdadeira raiz da humildade, da reverência filial, da genuína

piedade, da resistência em todo combate, das orações

fervorosas, da perseverança no sofrimento e na confissão da

verdade, e da duradoura alegria em Deus. Além disso, a

reflexão sobre esses benefícios é para eles um incentivo à séria

e constante prática da gratidão e das boas obras, como

evidencia o testemunho da Escritura e os exemplos dos

santos.

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Comentário: De fato, ao contrário do que supõem

alguns, todas as doutrinas da Graça nos humilham

grandemente, nos fazem sentir muita gratidão, temer a Deus e

desejar servi-lo ardentemente. Elas nos estimulam a um viver

piedoso e, a amar a Deus de todo o coração, pois revelam o

grande amor de Deus por nós, tendo piedade de nós, mesmo

quando estávamos em inimizade contra ele e vivendo nos

esquivando dele; ele veio ao nosso encontro, estendeu-nos a

destra da misericórdia, perdoou-nos e acolheu-nos em sua

família. Como cantou o salmista: “Os teus votos estão sobre mim, ó

Deus; eu te renderei ações de graças; Pois tu livraste a minha alma da

morte” - Salmo 56.12-13. Quando temos consciência de onde

Deus nos tirou e do que livrou-nos – corpo e alma –,

desejamos louvá-lo mais e mais e nos separar para ele e para o

seu inteiro agrado - “E qualquer que nele tem esta esperança

purifica-se a si mesmo, como também ele é puro” - 1ª João 3.3.

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Poderíamos citar muitos valiosos exemplos nas escrituras e

também fora delas, de homens piedosos, que tiveram muita

clareza quanto a sua salvação graciosa e que jamais viveram de

maneira desleixada, antes viveram numa fervorosa relação

com Deus durante toda sua vida aqui na terra. Um grande

exemplo desse fato é o apóstolo Paulo. Poucas pessoas

tiveram uma firmeza tão grande na fé e segurança da sua

salvação. Isso, longe de tornar Paulo inexpressivo ou vaidoso

em seu testemunho, ao contrário, ele foi vibrante,

entusiasmado e serviu ao Senhor fervorosamente. Como ele

temos uma multidão de outros santos que, de igual modo, a

certeza do perdão de Deus e de sua salvação os fez dedicar-se

totalmente a ele com grande gratidão e fervor.

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Artigo 13 – Essa certeza não leva à negligência

A confiança renovada também não produz a falta de

zelo ou negligência da piedade naqueles que foram

restaurados, após caírem; antes, produz neles um cuidado

ainda maior em observar os caminhos do Senhor, que ele

preparou de antemão. Eles guardam esses caminhos para que,

ao andar neles, mantenham a certeza da sua própria

perseverança. Então, o rosto do seu Deus gracioso não se

afastará deles novamente por abusarem da us bondade

paternal, para não caírem em maior angústia espiritual. De

fato, para os que temem a Deus, a contemplação do seu rosto

é mais doce do que a vida, e o privar-se dela é mais amargo do

que a morte.

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Comentário: O verdadeiro crente é filho e sente muito

quando causa motivo de tristeza ao seu Pai celestial. Se

comete algum pecado, nele não permanece, mas clama pelo

perdão e purificação. Depois de perdoado e restaurado à

plena comunhão, esforçar-se-á grandemente para não mais

cair em desobediência. A coisa que mais o homem piedoso

teme é pecar e entristecer o Espírito Santo. Para ele há pelo

menos uma coisa pior do que a morte física – o pecado.

“Antes morrer que pecar”, esse foi o lema dos mártires,

porque a morte pode ser ganho, mas para o pecado

estabelecido e não coberto pelo sangue de Cristo, não há

recurso - “Porque para mim o viver é Cristo, e o morrer é ganho” -

Filipenses 1.21. Só de pensar na possibilidade de ficar sem a

plena e doce comunhão com o Pai celestial, por causa de

pecado, nos faz aborrecer-nos a nós mesmos e odiar a nossa

vida neste mundo e, sonhar com o dia eterno, em que isso

não será mais uma possibilidade.

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Artigo 14 – O uso dos meios de graça na

perseverança

Assim como agradou a Deus começar essa obra de graça

em nós pela pregação do evangelho, assim ele a mantém,

continua e aperfeiçoa em nós pelo ouvir e pala leitura da sua

Palavra, pela meditação nela, pelas suas exortações, ameaças e

promessas, e pelo uso dos sacramentos.

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Comentário: As bênçãos espirituais nos são dispensadas

através das práticas e atos espirituais. Tudo o que o Senhor

ordenou a nós, é porque nos traz benefícios espirituais. Ler a

Bíblia, orar, cantar salmos, meditar na Palavra, congregar,

ouvir a pregação, participar do partir do pão e do cálice,

exortar-nos mutuamente, praticar obras de caridade, e todo

nosso trabalho no reino de Deus nos trazem bênçãos. Quanto

mais estivermos envolvidos com o reino de Deus, quanto

mais contemplarmos o reino, respirarmos seu ambiente e

quanto mais essa for nossa motivação, tanto mais abençoado

seremos, mais teremos firmeza na fé e confiança em nossa

jornada.

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Artigo 15 – Essa doutrina é odiada por Satanás,

mas é amada pela Igreja

Essa doutrina da perseverança dos verdadeiros crentes e

santos, assim como a convicção que eles têm dela, Deus

revelou abundantemente em sua Palavra para a glória do seu

nome e consolo dos piedosos. Ele é quem imprime no

coração dos crentes. É algo que a carne não compreende, que

Satanás odeia, que o mundo zomba, que os ignorantes e os

hipócritas ultrajam, e que os heréticos atacam. A Noiva de

Cristo, por outro lado, sempre a defendeu firmemente como a

um tesouro de valor inestimável; e Deus, contra quem

nenhum plano pode prosperar ou força alguma prevalecer,

cuidará para que a Igreja continue a fazer assim. Somente a

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este Deus – Pai, Filho e Espírito Santo – seja a honra e a

glória para sempre. Amém!

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Comentário: A perseverança do verdadeiro crente é

certa, porque Aquele que começou a obra da redenção, é fiel e

poderoso para completá-la, e ele o fará. A salvação é uma

bênção completa e não pela metade; totalmente segura e não

mais ou menos - “E o Deus de toda a graça, que em Cristo Jesus vos

chamou à sua eterna glória, depois de haverdes padecido um pouco, ele

mesmo vos aperfeiçoará, confirmará, fortificará e fortalecerá” - 1ª Pedro

5.10. Para os crentes essa doutrina é muitíssimo preciosa,

porque nos leva ao descanso nas promessas do Pai; mas, o

inimigo a odeia, justamente porque a glória de Deus está

envolvida aqui de maneira especial. Isto é, Deus nos salva

para a sua glória. Ele nos elegeu para a Sua glória, nos

chamou, justificou e nos preserva em santidade até a

glorificação, também para a sua glória - “E nos predestinou para

filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo... Para louvor e glória

da sua graça... Nele, digo, em quem também fomos feitos herança...

Com o fim de sermos para louvor da sua glória” - Efésios 1.5-6, 11, 12.

A oposição do inimigo, só nos faz lembrar que o próprio

Senhor Jesus Cristo assegura, que nenhuma das suas ovelhas

se perderá, nenhuma será desprezada - “Todo o que o Pai me dá

virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora” -

João 6.37. O Senhor pode nos guardar como ninguém. As

ovelhas de Cristo são assunto entre ele e o Pai: “Tenho guardado

aqueles que tu me deste, e nenhum deles se perdeu” - João 17.12.

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Agradeçamos ao nosso Pai celestial por tão grande e segura

salvação. Amém.

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Pr. Nelson Nincao

Londrina – Abril – 2023

Junte-se a Nós

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Central para o nosso culto de adoração são a pregação da Bíblia Sagrada, canto congregacional e oração. A intenção é louvar a Deus; Ele é o foco do serviço.

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